quarta-feira, 29 de abril de 2020
Atrás da Estante(Circus of Books, EUA, 2020)
Circus of Books foi uma grande livraria/vídeo-locadora/sex shop gay que por mais de 30 anos foi o lugar em Los Angeles, onde muita coisa acontecia entre homens atrás das estantes em meio às capas de filme pornô.
O espaço foi fundado por um casal fofo de judeus conservadores, principalmente a esposa e escondiam da família e dos amigos o tipo de negócio que mantinham.
Mantendo o espaço o casal testemunhou períodos como o auge da AIDS, a censura e a ascensão do pornô gay quando se tornaram inclusive produtores de seus próprios filmes.
A direção do documentário é da filha do casal, por isso apesar de todo o conteúdo homoerótico paira uma vibe muito familiar no ar. Ryan Murphy, dos sucessos Pose e American Horror Story é quem assina a produção executiva.
O documentário conta com depoimentos muito interessantes como os de Larry Flynt, fundador da revista Hustler, Jeff Stryker GRANDE astro pornô e Alaska, drag ganhadora do Ru Paul's Drag Race All Stars.
La Casa de las Flores 3ª Temporada(México, 2020)
sexta-feira, 17 de abril de 2020
POSE - 1a TEMPORADA(EUA, 2018)
The category is... Nova York, 1987. Somos levados para dentro da casa Abundance, uma casa para pessoas LGBT que se apresentam competindo em bailes em diferentes categorias e concorrendo a troféus, sob a tutela da mãe Elektra, uma transexual egocêntrica. O universo dos ballrooms já havia sido tema do icônico documentário Paris is Burning, de 1990 mas na série de Ryan Murphy, criador de American horror story, ele é cheio de tramas e nuances.
Billy Porter é Pray Tell o animador dos bailes e sempre responsável por apresentar as categorias. No primeiro episódio na categoria realeza os membros da casa Abundance desfilam com muita opulência peças roubadas de uma exposição de museu. É um arraso total. Billy Porter defende seu personagem com ousadia e delicadeza, ele é uma espécie de elo entre as casas e que está sempre disponível para consolar sua amiga Blanca.
Conhecemos também a realidade de Damon, jovem que sonha ser dançarino mas que é expulso da família pelo pai. Seu caminho se cruza com o de Blanca, que cansada das futilidades da casa Abundance resolve criar sua própria casa de acolhimento. Os Evangelista.
Blanca acaba de descobrir que está com HIV mas isso não fará com que ela se vitime, aliás a torna mais forte para tocar a frente sua casa. A AIDS em seu período mais prolífero é junto dos bailes o pano de fundo de Pose, que dá o tom a vários conflitos, por exemplo como viver com o vírus e como aceitar a morte de tantos tão próximos.
A trans Angel ganha a vida fazendo programa no Pier, ela também larga a casa Abundance para receber os cuidados de Blanca. É através dela que conhecemos Stan Bowes, personagem de Evan Peters, um executivo em ascensão e que é o típico cara 'hétero' com família que sai com mulheres trans. Angel é o retrato de esperança mas reafirma a ideia de que pessoas LGBT não podem ser felizes.
A série é cheia de momentos épicos, os concursos são sempre um show à parte e o fato de ser majoritariamente estrelado por um elenco de trans já lhe dá todos os méritos. Ao longo dos episódios vamos conhecendo um pouco mais sobre cada personagem e vemos a riqueza de sua construção. Tudo isso é embalado por uma trilha sonora impecável com hits de Whitney Houstoun, Chaka Kahn, Kate Bush e Roxette.
Pose é uma série não apenas histórica mas também sobre libertação das amarras da sociedade. Além de todo o glamour dos bailes, a série também apresenta o fenômeno Vogue que se popularizou anos mais tarde com Madonna.
Com a casa Evangelista acompanhamos as alegrias e a dor de ser gay em um período de epidemia. É sobre ser excluído e encontrar um lugar para chamar de seu. Romances, luto, traição, glamour, superar dificuldades e preconceitos é sobre tudo isso que a série trata. Pose é a obra prima de Ryan Murphy e sua segunda temporada, já disponível, também não deixa nada a desejar.
sexta-feira, 10 de abril de 2020
Tudo sobre minha mãe(Todo sobre mi madre, Espanha, 1999)
Tudo sobre minha mãe parte da premissa mais dolorosa na vida de uma mulher: a perda de um filho. Esteban é a prole amada de Manuela(Cecilia Roth), ele gosta de Truman Capote e A Malvada, filme esse, que o longa de Almodóvar homenageia, por mostrar os bastidores do teatro e inclusive no título do original All About Eve.
Vencedor do Oscar de filme estrangeiro, em 2000, o longa dá sequência a uma fase mais madura na carreira de Pedro Almodóvar, iniciada por A Flor do meu Segredo(1996) e Carne Trêmula(1997). Nesse primeiro, Almodóvar já dava pistas do que viria a seguir numa cena sobre doação de órgãos, muito parecida com o que vemos aqui.
Após assistir a mãe que é enfermeira fazendo uma simulação sobre doação de órgãos Esteban a encontra no teatro para assistirem Um bonde chamado desejo, peça que faz parte da narrativa do filme. O espetáculo é estrelado por Huma Rojo(Marisa Paredes) atriz que se deu esse nome em homenagem à fumaça dos cigarros de Bette Davis, em mais uma referência à A Malvada.
Quando Huma Rojo deixa ao teatro ao lado de sua amante e colega de cena Nina(Candela Peña), sob uma forte chuva, Esteban que estava de aniversário, decide correr atrás do carro para pedir um autógrafo. Ele é atropelado, a sequência é uma das mais dramáticas da filmografia de Almodóvar, a câmera é posicionada no chão no lugar do corpo do filho enquanto a mãe chora ao fundo desesperada e clamando por seu nome: "Estebán, Hijo Mio!"
Após Manuela consentir a doação do coração de Esteban, ela parte para ver o transplantado em Coruña. Destroçada ela resolve viajar de Madri para Barcelona, atrás do passado que sempre escondeu do filho: a verdade sobre seu pai.
A cena do túnel que leva Manuela para Barcelona é belíssima, ao som da canção catalã Tabajone. Chegando lá ela vai a um reduto de prostituição, ao ar livre ,onde acaba encontrando a transexual Agrado(Antonia San Juan) personagem fundamental de seu passado.
Com Agrado, Manuela finalmente fala sobre o pai de Esteban, a travesti Lola com quem viveu um amor inusitado. Junto de Agrado os diálogos almodovarianos se acentuam e a trans imprime humor em um filme até então tão dramático.
Em seguida entra em cena Irmã Rosa, Penélope Cruz em seu segundo papel com Almodóvar, uma freira que trata de ajudar Manuela mas acaba mais dependente dela ao descobrir que está esperando um filho de Lola.
Em uma noite Manuela volta a Um bonde chamado desejo, que está em cartaz em Barcelona. O diretor segue misturando linguagens: teatro e cinema. Manuela acaba indo ao encontro de Huma Rojo, que sofre pois sua namorada Nina é viciada em heroína. Manuela a ajuda, e acaba indo trabalhar nos bastidores do espetáculo com a diva.
Sem dúvida Tudo sobre minha mãe é um filme sobre mulheres fortes e empoderadas e que aos poucos apresenta os diálogos mais icônicos entre essas personagens femininas, em determinado momento Manuela solta a pérola “Yo no soy puta, me han puteado mucho en la vida pero yo nunca he sido puta.”
Quando Nina não pôde atuar no espetáculo por estar completamente drogada, Manuela a substitui reprisando o papel que fez há 20 anos com Lola, é nesse fragmento de seu passado que Um bonde chamado desejo segue na narrativa.
Assim como Huma Rojo se torna parte fundamental da vida de Manuela o mesmo acontece com irmã Rosa que se descobre grávida e soropositiva e acaba sob os cuidados da enfermeira.
Quando Agrado vai trabalhar no teatro com Huma, Antonia San Juan brilha na personagem, com um texto afinadíssimo e um monólogo inesquecível onde larga hinos como “una es más autentitca cuanto más se parece ha lo que ha soñado de si misma”.
A volta à Barcelona de Manuela faz com que ela reencontre muito mais que seu passado e finalmente reveja Lola. Graças a Rosa ela acaba se tornando mãe de um novo Esteban e vivendo experiências que jamais sonharia após a dor da perda de um filho.
Tudo sobre minha mãe é um filme de alma feminina, dolorido, comovente, arrebatador, mas que no final tem uma mensagem muito forte e poderosa de esperança. É um filme sobre mães, atrizes, trans, santas, loucas e putas.
terça-feira, 7 de abril de 2020
Morte em Veneza(Mort à Venise, Itália/França, 1971)
Luchino Visconti, grande ícone do cinema italiano e realizador de obras primas como O Leopardo e Rocco e seus irmãos, foi um dos representantes do chamado neo-realismo italiano. Em Morte em Veneza ele adapta o romance homônimo de Thomas Mann publicado originalmente em 1912.
O filme trata do tema do envelhicemento onde um compositor, Aschenbach encontra em Tadzio, um garoto que representa seu seu sonho de juventude um novo respiro para a vida. Além de diálogos que debatem a importância da arte, o longa mostra uma relação de voyeurismo e até mesmo pedofilia. Tadzio não tem contato com o maestro a não ser por olhares.
A trágica história de amor impossível é ambientada na Veneza burguesa do século XX, e trata de uma maneira humana como é envelhecer sem perder a vivacidade. A obra não é unanimidade entre os críticos, justamente por fazer muitas mudanças do livro e ter um ritmo arrastado, mas que faz parte da trajetória dos fatos.
quarta-feira, 1 de abril de 2020
Trixie Mattel - Moving Parts(EUA, 2019)
O documentário acompanha o dia a dia de Brian Firkus conhecido como a Drag Trixie Mattel, participante da sétima temporada de Ru Paul's Drag Race e vencedora de All Stars 3. No filme vemos como Brian é o oposto de seu alter ego Trixie, sempre tímido porém sagaz nas escolhas de sua personagem.
Vemos como Trixie trabalha sendo a única drag queen folk já revelada pelo programa, acompanhamos sua turnê pelos EUA, seu processo criativo, a conturbada relação com Katya e sua vitória no programa All Stars, aliás graças a isso várias RuGirls fazem participações no filme.
Fãs de Drag Race ficarão felizes por poderem ver uma de suas participantes ao natural embora a narrativa do filme lhe mostre sempre como uma pessoa solitária. Mattel é a personificação da Barbie camp e ela mostra isso em todas as suas apresentações com música e comédia.
Com pouco mais de 1h30 o documentário passa voando graças a desenvoltura de Trixie Mattel e seus planos de carreira sempre muito bem elaborados. Brian é um amorzinho e desmontado nem chega a lembrar toda a opulência de sua personagem.
Disponível na NETFLIX.