domingo, 17 de março de 2024

Brutal Heat(Brutální vedro, República Tcheca/Eslováquia, 2023)

Em um futuro próximo, o mundo inteiro será tomado por uma onda de calor, que levará a uma série de tumultos. A razão para isso é um fragmento do Sol que está se dirigindo para a Terra e chegará a ela em cerca de 30 anos.

No entanto, Vincek (Vincent Hospodářský), de 18 anos, está apenas marginalmente ciente da agitação no mundo. Em casa, ele sempre entra em conflito com o pai, quando não está entediado vendo a agitação na rua em frente ao seu apartamento. Uma ligação de um amigo chega na hora certa, porque ele convida Vincek para passar um fim de semana em sua cabana no campo. No caminho, ele conhece principalmente pessoas estranhas, que são caracterizadas por um impulso sexual intensificado e aumento da agressividade.


O motivo da viagem está no centro da obra do diretor Albert Hospodářský, embora seja descrito como um filme apocalíptico, o diretor insiste que Brutal Heat é, antes de tudo, um road movie. O  que de alguma forma é o condutor narrativo de muitos filmes catástrofe.


A perspectiva de uma sociedade em desintegração permite ao diretor e roteirista muita liberdade. Vemos a atração dos dois homens um pelo outro, ao qual eles não conseguem mais resistir. Nesses momentos, o filme mostra que o apocalipse que se aproxima não traz apenas as imagens usuais e carregadas de clichês de destruição e violência, mas também da despedida de outros medos e preconceitos, que, curiosamente, ainda se aplicam em certos contextos. 


Não é por acaso que tantas pessoas em Brutal Heat estão com tesão, raiva ou uma mistura de ambos. Com suas sequências de cenas surreais, ele está tentando fazer uma declaração sobre como as pessoas se divertem quando confrontadas com o fim do mundo. É quase como se o fragmento do Sol queimasse todas as nuances humanas possíveis e deixasse para trás apenas a parte mais instintiva.

O longa apresenta uma história de amadurecimento centrada na Geração Z que se concentra menos nas provações dos jovens e mais em capturar a mentalidade e o ambiente sociopolítico com o qual eles estão lidando. O filme entrega uma declaração geracional repleta de tons cínicos, desencadeada pela primeira interação de Vincek com pessoas mais velhas em um passeio de trem que rapidamente se transforma de conversas casuais em conflitos intergeracionais.


O evento astronômico serve como uma metáfora para as mudanças climáticas, usada para enfatizar restrições morais e psicológicas. Brutal Heat compartilha características com a sátira, no entanto, Hospodářský minimiza o elemento caricato para destacar o contexto global que molda a geração jovem. 


Ao lado da trama muito atual e curiosamente concebida , o filme não perde sua novidade em termos de forma. Algumas cenas, sublinhadas tanto pelas composições executadas pelo próprio Albert Hospodářské quanto pelos solos de guitarra, de Jan Tomáš ,do duo musical Tomáš Palucha, conseguem construir uma sensação de tensão surreal que pode ou não escalar para um desastre irreversível a qualquer momento.



sexta-feira, 15 de março de 2024

Frida(EUA, 2024)


Este não é o primeiro filme sobre a pintora mexicana Frida Kahlo, que viveu de 1907 a 1954. Mas o documentário de Carla Gutiérrez, narra a vida da artista através de um diário animado, usado como fio condutor, e sem depoimentos. Fernanda Echevarria del Rivero dá voz à Frida e faz isso de forma muito eficaz.


As palavras de Frida podem dominar aqui, mas também há citações expressas de muitos outros que desempenharam um papel em sua vida, incluindo o artista Diego Rivera, com quem se casou duas vezes, sua amiga Lucile Blanch e o escritor André Breton, que a incentivou a ir à Paris após uma exposição individual em Nova York, em 1938.

A vida de Frida é apresentada basicamente em ordem cronológica. Mesmo em seus tempos de escola, Frida já era uma rebelde que se destacava contra sua mãe religiosa e, quando jovem, estava pronta para abraçar o comunismo, no qual via o espírito da revolução mexicana de Emiliano Zapata.

Descarada no uso de uma linguagem forte e com um potente desejo sexual, ela nunca foi de se conter. Ela trouxe suas pinturas para Diego Rivera, casou-se com ele apesar de chamá-lo de "cara de sapo" e viajou com ele para Nova York. Lá, ela era altamente crítica do que via dos ricos, assim como no final da década ela desrespeitaria muitos intelectuais franceses, incluindo até então Breton, que procurou categorizar sua pintura como surrealista (ela não concordava e dizia isso).



Ouvir os comentários de Frida feitos sem reticências fornece uma visão eficaz de todos os aspectos de sua vida, incluindo a dor ao longo da causada por seu envolvimento em um acidente de ônibus aos dezoito anos, seu aborto espontâneo durante seu primeiro casamento com Rivera e seu reconhecimento franco de seus muitos casos com homens e mulheres. 

Ao mostrar suas obras de arte – muitas delas autorretratos – Gutiérrez optou por usar recriações digitais e depois elaborá-las com toques de animação. O resultado é certamente colorido, mas brincar com a arte deixada por Frida Kahlo, é no mínimo arriscado.


Mas o que o filme faz de melhor  é pintar um quadro de Frida para o público. O uso das próprias palavras de Kahlo diferencia este documentário, dando-lhe uma vivacidade ao mostrar o estilo, a criatividade e a personalidade da artista. 


O documentário, com muito material de arquivo e fontes (coleções particulares de arte incluídas), mostra respeito por diferentes aspectos de sua vida, a narrativa é baseada em fatos e enfatiza seus sentimentos, emoções e reações ao que viveu e viu, escrito no contexto íntimo de seu diário.



terça-feira, 12 de março de 2024

Garotas em Fuga(Drive-Away Dolls, EUA/Reino Unido, 2024)

Garotas em Fuga, é o filme de estreia individual de Ethan Coen, embora carregue muitos elementos dos longas realizados com seu irmão Joel, especialmente ‘Fargo(1996)’. Ethan segue com um solo cinematográfico na forma de uma trilogia sáfica.

A louca por sexo Jamie (Margarteth Qualley) é repetidamente pega traindo. Seu relacionamento com Sukie(Beanie Feldstein, de Ladybird(2017) e Booksmart(2019), uma policial histérica, com problemas de agressão, finalmente chega ao fim, para dar espaço ao uma aventura psicodélica na estrada.


A melhor amiga sexualmente contida de Jamie, Marian (Geraldine Viswanathan), na verdade queria visitar sua tia em Tallahessee sozinha. Mas Jamie se junta à jornada. De uma empresa duvidosa elas pegam o chamado drive-away, um carro que vai ser transferido. E como era de se esperar, as duas se confundem, pegam o carro errado com carga roubada, são perseguidas por gângsteres bizarros e quase não percebem nada sobre isso. 


Ethan surpreende com algumas cenas curiosas. As aventuras sexuais distraem repetidamente da caça à infame mala. Pelo meio, são inseridas repetidamente sequências psicodélicas, que se destinam a separar ou ligar cenas individuais. Seu significado não é muito claro, e inclui a participação especial de Miley Cyrus como uma artista icônica ao longo do caminho.


O que levanta questões são as referências históricas. Ambientado em 1999, o filme aborda o pânico da chegada dos anos 2000, a era Clinton minguante, ou Massachusetts como o primeiro estado a permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo. 



Vale destacar o trabalho especialmente de Margaret Qualley, uma atriz com muita energia e muito a oferecer, que abraça sua personagem sem medo. Ao lado dela estão nomes como Colman Domingo, Joey Slotnick e C.J. Wilson e a presença de Pedro Pascal, Miley Cyrus e Matt Damon, em participações especiais.


No meio do caminho entre a narrativa dos anos sessenta e setenta, Ethan Coen dá um estilo muito particular ao filme, preenchendo-o com referências e espaços visuais diferentes do habitual, com muitos jogos com a câmara, com uma montagem cheia de transições muito pessoais, com aqueles sonhos cheios de cor e luzes.


Garotas em Fuga não é o mesmo que um filme dos irmãos Coen. É claramente algo diferente. No entanto, Ethan se dá ao luxo de colocar sua marca em um filme bandido que é ao mesmo tempo um road movie e uma espécie de amadurecimento sáfico.


O longa como um todo consegue fazer com que a psicodelia que envolve Garotas em Fuga funcione e se torne um elemento importante para a resolução da trama. Nesse sentido, o roteiro, de Coen e a esposa Tricia Cooke, se joga.


Os respectivos filmes de estreia dos dois irmãos dificilmente poderiam ser mais diferentes. Enquanto Joel filmou 'MacBeth(2021)', um drama em preto e branco artisticamente ambicioso, Ethan prefere que seja mais colorido e bem-humorado. Desde o início, ele atinge tons bastante estridentes, misturando gêneros, com uma propensão para a grosseria a la John Waters, quando observamos Jamie despreocupadamente por aí.






quarta-feira, 6 de março de 2024

Mary & George(Reino Unido, 2024)

Encabeçado por Julianne Moore, além de Nicholas Galitzine, Mary & George, série em 7 episódios da STARZ, acompanha uma mãe e um filho que não medem consequências para se tornar uma das famílias mais poderosas da Inglaterra, do século 17.

Inspirado na história real e no livro de não-ficção, de Benjamin Woolley, The King's Assassin, a série foi escrita por DC Moore (Killing Eve) com licença poética, dando uma ideia da época, pintando cenas como obras renascentistas, e sugerindo o que poderia ter acontecido por trás das paredes de um palácio.


Após a morte de seu pai (Simon Russell Beale), a família Villiers se vê em um estado de insegurança financeira. A engenhosa matriarca Mary (Moore), decide resolver as coisas com as próprias mãos. Ela envia seu filho George para a França, onde recebe um curso intensivo de participação em orgias.

Enquanto isso, ela tenta se agarrar à segurança financeira ao se casar com Sir Thomas Compton (Sean Gilder). Enquanto seu filho ganha confiança para seduzir e conquistar o rei Jaime I (Tony Curran), e para elevar a família na realeza.


E não são apenas os homens que se relacionam uns com os outros. Mary também é parte de um romance queer com Sandie (Niamh Algar), a dona do bordel, que virou sua amante. Suas lutas de poder são particularmente interessantes, pois revelam um lado mais suave da personagem.

Uma das coisas gloriosas sobre a atração e é que ela não apenas joga luz sobre um capítulo menos conhecido da história LGBTQ+ e real britânica, mas certamente elimina o trauma que muitas vezes pode vir de histórias marginalizadas. Aqui, qualquer experiência sexual é simplesmente a norma e, em vez de lidar com homofobia ou preconceito, a série está mais preocupada com liberdade e ideias anacrônicas.


Tudo isso soa como uma configuração bastante familiar, é provavelmente porque é uma dinâmica muito semelhante à retratada no vencedor do Oscar de 2019, A Favorita, de Yorgos Lanthimos. 


terça-feira, 5 de março de 2024

O HOMOEROTISMO NO CINEMA

 
Explorando a representação dos afetos e atrações homossexuais, o modo como o cinema retrata os  humanos e seus desejos, é o HOMOEROTISMO, está presente na literatura, artes visuais, fotografia, e até mesmo na religião. Na 7ª arte, vai além das relações homoafetivas, mas também na explanação profunda de corpos. Nos vídeos abaixo traço uma linha do tempo, desse movimento no cinema:

domingo, 3 de março de 2024

ManSuang(Tailândia, 2023)


Em toda sua opulência, que remete à Adeus Minha Concubina, o que mais chama a atenção à primeira vista, em ManSuang é sua herança cultural. Patrocinado pelo governo da Tailândia, o longa acompanha a luta pela vida de dois dançarinos que entram em um clube social de alto nível e contam com o apoio de um novo aliado para expor traições, em Siam.

Ambientado no século XIX, o longa de Ning Bhanbhassa Dhubtien, Chartchai Ketnust e Pond Krisda Witthayakhajorndet, apresenta belas danças realizadas em trajes tradicionais. Khem e Wan estão em ManSuang depois de serem enviados para lá por seu mestre. Ambos eram suspeitos do assassinato do sobrinho e, se quisessem ter suas vidas perdoadas, tinham que cumprir uma missão, a missão consistia em encontrar os documentos que sugeriam as evidências da venda ilegal de armas aos europeus.


Khem(Apo Nattawin Wattanagitiphat) e Wan(Bas Asavapatr Ponpiboon) encontram outro homem, Chatra(Mile Phakphum Romsaithong), um baterista. Khem pensa que pode acreditar no real motivo de ele ter entrado no clube, mas Chatra também não é inocente e carrega uma razão oculta.

ManSuang é um lugar complexo para se viver e as pessoas lá nunca mostram suas reais intenções e se escondem atrás de máscaras. Esses três jovens começam a investigar e acabam correndo muito mais perigo do que poderiam imaginar.


O longa é uma excelente combinação das tradições locais da Tailândia com música e danças folclóricas. Tudo é misturado com um mistério de assassinato que esses três homens começaram a investigar. 


Outra ponto é Khem ser gay e ser explorado por seus mestres. As pessoas, sobretudo, naquela época eram homofóbicas, e hipócritas, e criticavam Khem por sua sexualidade. Mas o filme tem como alvo uma parcela maior de público e será bem-sucedido em cortejá-los com música e dança.




sexta-feira, 1 de março de 2024

4 ANOS DE CINEMATOGRAFIA QUEER

 

Março é o mês de aniversário do CINEMATOGRAFIA QUEER. São 4 anos desse projeto que me enriquece, não só cinematograficamente, mas em todo espectro das artes. Para celebrar, estou preparando uma série de conteúdos especiais, revisitando o que já foi produzido até aqui. 📽️🏳️‍🌈

Em números, somos alguns milhares de seguidores, (ainda não chegamos em 10k 😢), 1.182 posts no blog, 1.176 no Instagram e mais de 30.700 tuítes. Crescendo lá no @letterboxd e fazendo picardias juvenis no @TikTokBrasil.


A página nasceu da necessidade de falar de 'Dor e Glória', de Pedro Almodóvar, e a partir de então foi ganhando forma, substância e conteúdo. O trabalho é árduo e sempre gera questionamentos, mas hoje estou aqui apenas para agradecer cada um que apoia o CINEMATOGRAFIA QUEER. 🥳🏳️‍🌈



quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024

Conann(Bélgica/França/Luxemburgo, 2023)

O conto clássico de Conan foi criado durante a era das revistas pulp, dos anos 1930, para encantar aqueles que procuravam aventura através de uma lente de fantasia e imortalizado no cinema em ‘Conan, o Bárbaro', de 1982, estrelado por Arnold Schwarzenegger. O realizador francês Bertrand Mandico, inverte o gênero, rebatiza Conann, e dá uma chance às mulheres de se tornarem brutais, senhoras da guerra e bárbaras, neste filme de arte sexualmente fluido.

Na velhice, no inferno da amnésia. Conann (Françoise Brion) ouve a história de sua vida, narrada por Rainer (Elina Löwensohn), a cadela do submundo, que a leva a lembrar de tudo, desde sua escravidão em Sanja e sua ascensão como bárbara, até sua entrada em um mundo cercada de crueldade.  Bertrand Mandico reformula a figura de Conann entre flashes, brilho, violência, sangue, amor, fogo, crueldade e morte, de um ponto de vista estritamente conceitual e filosófico.


De espadas arrancadas, feridas que nunca cicatrizam completamente e mutações grotescas, o sangue flui livre como vinho para o cálice de Conann. Isso sem falar nos horrores existenciais da guerra e toda a carnificina gratuita que vem com ela, o que impulsiona os aspectos mais perturbadores do filme.


Ao apresentar a protagonista interpretada por seis diferentes atrizes, cada uma com dez anos de diferença, Mandico cria essencialmente uma estrutura episódica. Algumas sequências se inclinam mais para os nichos da fantasia, enquanto outras vão em uma direção cyberpunk. No entanto, o diretor consegue fazer tudo fluir bem de uma maneira onírica.




As atrizes que interpretam as várias iterações da protagonista são todas excelentes - Claire Duburcq, Christa Théret, Sandra Parfait, Agata Buzek, Nathalie Richard e Françoise Brion. O desempenho de apoio de Elina Löwensoh, como o cachorro metamorfo, também é incrivelmente transformador.

Esteticamente, Conann é absolutamente magistral. Rodado num galpão, o filme é uma visão única, esotérica e caótica, mas cada quadro funciona. A fotografia, de Nicolas Eveileau, encontra o equilíbrio perfeito entre épico e ambicioso, mas dimensionado para permitir que funcione como uma homenagem a um gênero conhecido por sua opulência.


Talvez os melhores momentos do filme ocorram quando Conann pondera uma vida além da violência e da imortalidade, questionando o que significa criar um legado que realmente perdure. À medida que amadurece, Conann aprende com seus arrependimentos. Ela se torna cada vez mais complexa, experiente e ponderada, mas não menos bárbara.

Em entrevista à Variety, Mandico mencionou que Conann é a terceira parte da "Trilogia Afterlife", com Les Garçons Sauvages(2017) representando o Paraíso, After Blue(2021) sendo Purgatório e Conann,  Inferno. 



terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

Lisa Frankentein(EUA, 2024)

Zelda Williams tem o talento no DNA, ela é filha do eterno Robin Williams. Entendendo de comédia e da indústria, ela se juntou com a roteirista Diablo Cody, que ganhou um Oscar por sua estreia em Juno(2007), e roteirizou o cult Garota Infernal(2009), para seu filme de estreia, Lisa Frankenstein.  

A triste Lisa Swallows (Kathyrn Newton) frequenta uma nova escola nos subúrbios da Louisiana, em 1989. Ela está de luto pela perda de sua mãe, que foi brutalmente morta por um assassino mascarado. Ela não revela isso aos colegas e não deixa que sua nova bem-intencionada, a enteada de seu pai(Joe Chrest), Taffy (Liza Soberano) a anime.


Enquanto visita o cemitério local todos os dias, Lisa se apaixona pelo busto, na lápide de um cadáver, Cole Sprouse, sem falas, da era vitoriana. Um dia, uma tempestade de raios desenterra e reanima a cabeça do corpo. Assim, Lisa traz a bela cabeça para casa e a esconde em seu quarto, de Taffy e sua madrasta malvada (Carla Guigino), enquanto cria um novo corpo para ele.


Na sepultura úmida, a criatura sofreu algumas perdas em seu corpo. Mas com as habilidades de costura de Lisa e os choques elétricos de uma cama de bronzeamento, as partes podres podem ser substituídas pelas de cadáveres frescos. Não é difícil adivinhar qual peça de reposição será a cereja do bolo.


O filme lida com pessoas que não se encaixam. A protagonista é uma adolescente gótica no final dos anos 1980 que realmente não se sente pertencente, seja na escola ou em casa. Só alguém que está duplamente deslocado, vem de outro tempo e está morto, consegue trazê-la à vida. Em vez de se encaixarem, eles criam um mundo próprio.

Fora da trama e personagens bizarros, Lisa Frankenstein, é camp em sua estética e trilha sonora inspiradas nos anos 80, com bandas como The Echo and the Bunnyman, Pixies, Jesus and Mary Chain e When in Rome. Os figurinos extravagantes e a ambientanção, e as referências de Viagem à Lua(1902), de Méliès, a John Hughes, se prestam ao provável status de clássico cult, que o filme ganhará com os anos`\


Diablo Cody é uma observadora muito precisa de sua geração e das situações sobre as quais escreve. Em entrevista a roteirista revelou que teve como inspiração o clássico da Sessão da Tarde, Mulher Nota 1000(1985), onde dois adolescentes criam no computador a mulher ideal, no entanto aqui ela inverteu o gênero e roteirizou uma obra com uma ótica muito feminina.


No geral, Lisa Frankenstein é um filme divertido que parece um autêntico terror dos anos 80 ainda que misturado à clássicos como A Garota de Rosa-Shocking(1986) e Heathers(1988). É assustador nos momentos certos e hilário por toda parte. Kathryn Newton, que já havia mostrado seu potencial em Freaky(2020), prova que é uma scream queen de respeito!  





segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

CINEMA QUEER NO CINEANTIQUA


Sabe aquele filme clássico que é uma delícia de descobrir? O CINEANTIQUA é um canal do Youtube, especializado em cinema ancestral, e que, com uma curadoria incrível, oferece gratuitamente filmes do passado. O CINEMATOGRAFIA QUEER organizou uma seleção de obras, com temática LGBTQIAP, disponíveis por lá:

Navalha na Carne(Brasil, 1969), de Braz Chediak

Na adaptação, de Braz Chediak, para a peça de Plínio Marcos, Neusa Suely(Glauce Rocha), é uma prostituta decadente e explorada por Vado (Jece Valadão), seu cafetão. Em meio a brigas e desavenças, ela vai às ruas para ganhar dinheiro enquanto Vado sai com outras mulheres e passa a vida sossegado. O que eles não esperavam, era que Veludo, Emiliano Queiroz numa atuação incrível, um homossexual que trabalha como faxineiro, roubasse todo o dinheiro dos dois para comprar drogas.

ASSISTA


Decameron(Itália, 1971), de Pier Paolo Pasolini

Repleto de uma sensibilidade queer, nudez masculina e subversão, o filme é a adaptação de contos de Boccaccio, como as freiras devassas que realizam milagres sexuais, uma esposa traiçoeira com habilidade para negócios, um artista tuberculoso à beira da morte que tenta trapacear o Céu, jovens amantes flagrados e mais.


ASSISTA


Rebecca(EUA, 1940), de Alfred Hitchcock

Em 1940, o mestre Alfred Hitchcock chegava aos Estados Unidos com Rebecca, uma adaptação do romance homônimo, de Daphne du Maurier, incrivelmente fiel à obra literária original e seus controversos subtextos. Uma história de amor gótica dominada pelo suspense, além disso, entrega um romance heterossexual fracassado. Uma das personagens mais memoráveis do filme, a Sra. Danvers(Judith Anderson), oferece mensagens escondidas aos espectadores LGBTQIA+ dos anos 40.


ASSISTA


Noite Vazia(Brasil, 1964), de Walter Hugo Khouri

Em São Paulo, dois amigos (um deles casado e de família rica) tomam duas prostitutas para uma noite de busca de prazeres diferentes. Mas a experiência acaba por ser frustrante para todos os envolvidos, pela amargura em suas conversas e atitudes que revelam angústias e sentimentos mais profundos, além do vazio de suas vidas. Odete Lara e Norma Bengell brilham na pele das profissionais do sexo.


ASSISTA


As Lágrimas Amargas de Petra Von Kant(Die Bitteren Traenen der Petra Von Kant, Alemanha, 1972), de Rainer Fassbinder


Adaptado da peça homônima do próprio Rainer W. Fassbinder, Petra von Kant é uma estilista de sucesso extremamente arrogante e egocêntrica, que tem como única pessoa próxima sua secretária. Num dia, ela se apaixona por uma jovem aspirante à modelo chamada Karin, que vai morar em sua casa e usá-la até não precisar mais. Neste que é provavelmente o filme mais feminino do cineasta, homem nenhum aparece em cena, apenas simbolicamente através da tela Dionísio, que estampa a parede do apartamento. 


ASSISTA.


A Casa Sinistra(The Old Dark House, 1932), de James Whale

James Whale, um dos únicos diretores abertamente gays da época, realizou o filme que serviu como base direta para The Rocky Horror Picture Show. Um casal e seu amigo estão perdidos enquanto dirigem à noite em uma forte tempestade. Eles encontram uma antiga casa no interior do País de Gales, onde recebem abrigo de Horace Femm e sua irmã Rebecca. 

Toda Nudez Será Castigada(Brasil, 1973), de Arnaldo Jabor

Arnaldo Jabor adapta o texto de Nelson Rodrigues, onde o viúvo religioso Herculano se encontra em um dilema quando seu irmão, no intuito de ajudá-lo, marca um encontro com uma prostituta, Geni. O filho, se recusa a aceitar o relacionamento do pai, no entanto reserva um plot queer, que nunca foi inimaginável na obra do dramaturgo.


O Beijo da Mulher Aranha(The Kiss of Spider Woman, Brasil/EUA, 1985), de Hector Babenco


Em 1985 em meio à crise de produção do cinema nacional, Hector Babenco dirigiu em coprodução com os EUA, O Beijo da mulher aranha, baseado no romance homônimo do argentino Manuel Puig, e considerado sua obra prima. Com muitos atores brasileiros no elenco, mais notavelmente Sonia Braga, a trama transcende masculino e feminino ao abordar a relação entre dois prisioneiros em uma cela de prisão. Valentin( Raul Julia) é um jornalista preso político, enquanto Molina, interpretado pelo ganhador do Oscar, William Hurt, é um homossexual que está preso por corrupção de menores. 


ASSISTA.


Os Esquecidos(Los Olvidados, México, 1950), de Luis Buñuel

Viver às margens sempre foi um tópico queer. Com ‘Os Esquecidos’, Luis Buñuel mergulha na miséria mexicana para criar uma visceral crítica social. Mal recebido em sua época, o filme hoje é visto como um estudo de uma comunidade e contexto histórico, que se assemelha ao neorrealismo italiano. O diretor foi aos reformatórios, para pesquisar sobre esses jovens sem perspectiva e sem futuro.


O Beijo no Asfalto(Brasil, 1981), de Bruno Barreto

Baseado na peça de Nelson Rodrigues e estrelado por Ney Latorraca, Daniel Filho, Tarcísio Meira e Christiane Torloni, o filme acompanha o desfecho de um desconhecido que é morto ao ser atropelado por um ônibus e, agonizante, pede a um bancário que lhe de um beijo na boca. Este gesto é transformado em escândalo pela imprensa sensacionalista e o homem que cometeu o "crime" de beijar um agonizante passa a ser alvo de preconceito popular e também a ser investigado pela polícia, que começa a supor que o acidente tenha sido um assassinato.


ASSISTA


Zero de Conduta(Zéro de conduite, França, 1933), de Jean Vigo


O filme remete às experiências escolares das crianças francesas baseadas nas memórias do diretor Jean Vigo sobre sua própria infância. Retrata um sistema educativo burocrático e repressivo diante do qual os estudantes empreendem verdadeiros atos de rebelião por vezes surreais, resultado de leituras libertárias da infância. O título faz referência a nota de um dos meninos, que que lhes impede de sair no domingo. 


As Corças(Les Biches, 1968), de Claude Chabrol


Frédérique é uma rica e bela mulher que acolhe em sua casa uma artista de rua chamada Why, que desenha corças. Em uma viagem a Saint Tropez, Why se envolve com o arquiteto Paul Thomas. Por ciúme, a anfitriã resolve seduzir Paul e eles se apaixonam. Um clássico do cinema sáfico.



É bom ressaltar que esses filmes foram realizados em períodos difíceis para a comunidade LGBTQIA+, que não tinha a mesma liberdade de se expressar que hoje, por isso muitas vezes a mensagem ou a abordagem não é positiva, o que é adequado para o contexto da época. Inscreva-se no canal do CINEANTIQUIA e descubra esses, e muitos outros títulos do cinema clássico mundial.

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