terça-feira, 7 de janeiro de 2025

The Radleys (Reino Unido, 2024)

 "The Radleys", de Euros Lyn,e baseado no romance de Matt Haig, explora a vida de uma família aparentemente comum com um segredo sombrio: eles são vampiros abstêmios. A trama segue os Radleys, uma família que tenta viver uma vida normal, evitando beber sangue humano apesar de seus desejos naturais.

Este conceito é utilizado como uma metáfora para explorar temas como a repressão de desejos, o vício, e dinâmicas familiares. Os adolescentes da família, Clara (Bo Bragason) e Rowan (Harry Baxendale), são o centro do conflito quando suas naturezas vampirescas começam a emergir, forçando seus pais, Helen e Peter (Kelly Macdonald e Damian Lewis), a revelar a verdade sobre sua identidade.


Euros Lyn, conhecido por seu trabalho em séries como "Doctor Who" e "Heartstopper", traz um tom equilibrado entre comédia e horror. A direção tenta mesclar o humor ácido com elementos góticos e de terror, embora essa transição nem sempre seja suave. Visualmente, o filme mantém uma estética que reflete a vida suburbana britânica, mas com toques sutis que remetem ao mundo dos vampiros, como a iluminação e o design de produção.


Damian Lewis e Kelly Macdonald entregam performances sólidas, com Lewis interpretando dois personagens, Peter e Will Radley, que oferecem uma visão contrastante sobre a dualidade da natureza vampírica. A química entre os atores ajuda a sustentar a dinâmica familiar e o drama que se desenrola.

Com ares de True Blood, a abordagem original ao tema de vampirismo, vendo-o como uma reflexão sobre a condição humana e as lutas internas, são um grande trunfo. Mas enquanto o filme não é reverenciado por sua representatividade queer, há um romance muito latente entre dois personagens.


“The Radleys" é uma tentativa intrigante de revitalizar o gênero de vampiros com uma perspectiva de comédia e drama familiar. Embora não seja perfeito, oferece momentos de humor inteligente e uma reflexão sobre identidade e repressão. 



domingo, 5 de janeiro de 2025

Vivre, mourir, renaître (França, 2024)

O filme, de Gaël Morel, é um drama com uma abordagem nostálgica dos anos 90, um período marcado pela epidemia de AIDS. O filme é centrado em um triângulo amoroso composto por Emma ( Lou Lampros), Sammy (Théo Christine) e Cyril (Victor Belmondo), cujas vidas são intrinsecamente ligadas tanto pelo amor quanto pela doença.

Ambientado em Paris no início dos anos 90, o filme retrata a vida de três jovens que experimentam o amor em um contexto onde o HIV/AIDS ainda era uma sentença quase inevitável de morte. A trama explora as nuances de relacionamentos héteros, bi e homossexuais, apresentando um retrato inclusivo do amor e da amizade. 


Cyril, claro, tem um motivo oculto, ele é HIV positivo e recentemente parou de tomar o  AZT devido a efeitos colaterais insuportáveis. Acontece que isso não é um grande problema; tudo o que é preciso é uma ida à máquina de venda de preservativos mais próxima. 


A história avança ao longo de uma década, capturando a transformação pessoal e social dos personagens em resposta à crise sanitária. A chegada dos tratamentos como a terapia tripla, traz esperança e uma nova perspectiva sobre a vida.


Gaël Morel, conhecido por sua sensibilidade ao tratar de temas humanos profundos, mantém um tom melancólico  e poético. Como em Conquistar, Amar e Viver Intensamente (2018), de Christophe Honoré, o filme evita o melodrama excessivo, optando por uma abordagem mais sóbria e realista, embora não deixe de lado momentos de pura beleza.


Lou Lampros, Théo Christine e Victor Belmondo oferecem performances que são o coração do filme. Lampros, em particular, é notável por sua capacidade de transmitir vulnerabilidade e força. A química entre os atores é palpável, tornando o triângulo amoroso tanto crível quanto cativante.


o longa trata com delicadeza um tema pesado e é suavizado por sua trilha sonora POP. O filme é visto como um retorno triunfante de Morel ao cinema, com habilidade de criar uma narrativa que é ao mesmo tempo solar e sombria.


O filme é uma homenagem às vidas perdidas para a AIDS, mas também uma celebração do amor em todas as suas formas. Ele serve como um lembrete da fragilidade da vida e da resiliência humana frente à adversidade. Com sua direção sensível e performances comoventes, "Vivre, mourir, renaître" é mais que um longa sobre uma epidemia; é sobre a capacidade de renascimento, de encontrar luz na escuridão e de amar sem limites.



sábado, 4 de janeiro de 2025

This is The End (França, 2023)

O documentário "This Is the End" de Vincent Dieutre é uma exploração poética e introspectiva da cidade de Los Angeles durante a pandemia de Covid-19. Este filme, que combina elementos de road movie e de diário de bordo, oferece uma meditação sobre o estado do mundo contemporâneo, a passagem do tempo e as relações humanas em um cenário de crise.

Dieutre, um cineasta francês apaixonado pela cultura americana, especialmente pela contracultura dos anos 1970, decide viajar para Los Angeles pela primeira vez, motivado pela reunião com um antigo amante encontrado através do Facebook. A ideia é revisitá-lo após 40 anos desde seu primeiro encontro em um bar gay em Nova York. No entanto, a Los Angeles que ele encontra é bem diferente da América que o inspirou. A cidade está sob o cerco da pandemia, com uma atmosfera de abandono, onde até a natureza parece estar retomando seu espaço, com cobras em piscinas e plantas crescendo em lugares inesperados.


O documentário é dividido em várias partes que se entrelaçam: as cenas de reencontro com o amante, representado por um jogo de carícias que parecem congeladas no tempo como GIFs; as longas viagens de carro pela cidade, acompanhadas por reflexões filosóficas e observações sobre o presente; e a poesia como um refúgio e uma forma de resistência cultural. O Poetry Lounge emerge como um espaço onde a poesia é recitada, oferecendo uma crítica social e um olhar sobre a condição humana.


Vincent Dieutre utiliza a sua própria presença na narrativa como um dispositivo para questionar não apenas a cidade, mas também o cinema, a memória e o próprio ato de documentar. O filme é uma reflexão sobre a finitude, o fim de uma era, e ao mesmo tempo, uma busca por significado e esperança em um mundo que parece estar à beira do colapso. A narrativa é enriquecida por citações de filósofos como Bruce Bégout, que descreve Los Angeles como "Helldorado", um lugar de contrastes e desilusões.


"This Is the End" é tanto um retrato de uma cidade quanto um autorretrato de Dieutre, refletindo sobre sua própria história, as mudanças na sociedade, e a continuidade da vida artística e amorosa em tempos turbulentos. O documentário, com sua abordagem lírica e contemplativa, convida o espectador a pensar sobre o que significa estar no final de algo, seja de uma pandemia, de uma relação, ou de uma época cultural.


quinta-feira, 2 de janeiro de 2025

I Don't Know Who You Are (Canadá, 2023)

"I Don't Know Who You Are" é um filme urgente que te fará pensar VIVA O SUS! Benjamin (Mark Clennon), um músico de Toronto , é abusado sexualmente enquanto caminhava para casa depois de uma festa. Para evitar uma possível infecção pelo HIV, ele deve começar um tratamento com PEP — profilaxia pós-exposição — em até 72 horas, mas não é coberto pelo seu seguro. Custa quase US$ 1.000, e Benjamin, com seu cartão de crédito estourado e sua geladeira vazia, não tem como pagar. Os próximos dois dias são um exercício de conversas cada vez mais desesperadas, enquanto ele tenta levantar o máximo de dinheiro possível.

Em seu longa de estreia, o diretor canadense M.H. Murray, se destaca por sua abordagem sensível e intensa sobre temas como agressão sexual, o acesso à saúde e a luta pela dignidade e sobrevivência na comunidade queer. 


O filme é um estudo de personagem incisivo que também lança luz sobre a falta de assistência médica acessível para pessoas sem seguro nos EUA. Benjamin tem apenas 2 dias após sua agressão para começar a tomar o remédio porque ele não funcionará depois desse período. Não há dúvida de que ele precisa de terapia após um evento tão traumático, mas, antes disso, ele precisa evitar o risco de contrair HIV. 


“I Don't’ Know Who You Are”  é construído em um formato de thriller, com uma contagem regressiva que impulsiona a narrativa. A urgência de Benjamin para obter o PEP cria uma tensão palpável, transformando o filme em uma corrida contra o tempo. Essa estrutura também serve como um comentário sobre as falhas do sistema de saúde e os desafios enfrentados por aqueles sem recursos financeiros.




Mark Clennon entrega uma atuação impressionante como Benjamin, trazendo uma vulnerabilidade e autenticidade que enriquece o personagem. Sua performance, tanto emocional quanto física, ancorando o filme em um realismo que vibra profundamente


M.H. Murray demonstra um talento natural para a direção, equilibrando a estética minimalista com uma narrativa emocional e intensa. A escolha de filmar em locações reais, muitas vezes sem permissão, adiciona uma camada de veracidade ao filme, refletindo a realidade urbana de Toronto como um lugar ao mesmo tempo conectado e alienante


"I Don't Know Who You Are" aborda temas pesados como a violência sexual, a acessibilidade à saúde, e o isolamento social. No entanto, o filme não se contenta apenas em expor essas questões; ele também oferece um olhar esperançoso sobre solidariedade e resiliência, especialmente dentro da comunidade queer. 


"I Don't Know Who You Are" é uma estreia poderosa de um cineasta que entende a importância do peso emocional de uma história . É um olhar comovente sobre as realidades das injustiças médicas, as barreiras que as pessoas queer enfrentam e o poder de uma rede de apoio.



Come Closer (Israel/Itália, 2024)

"Come Closer" é o primeiro longa-metragem  da diretora Tom Nesher e se destaca como uma narrativa emocional sobre amor e perda, ambientada em Israel. A trama segue a vida de Eden (Lia Elalouf), uma jovem que enfrenta uma jornada de luto após a morte trágica de seu irmão, Nati (Ido Tako). O filme explora diferentes formas de amor, incluindo a relação de Eden com sua família, seu amante casado e, principalmente, com Maya (Darya Rosenn), a namorada secreta de seu irmão falecido.

Eden está tomada pela tristeza pela perda de seu irmão. Seus pais, após uma discussão desagradável e aparentemente interminável sobre o divórcio, não a confortam, seu irmão era realmente seu único aliado na vida. Em seu funeral, ela vê uma garota misteriosa na multidão que chama sua atenção. Quando ela mais tarde encontra um bilhete de amor enquanto vasculha as coisas de Nati, ela soma dois e dois e sabe que a garota misteriosa era a namorada secreta de Nati.


Ela vai confrontar Maya sobre o segredo que cerca seu relacionamento, mas acaba encontrando a única outra pessoa no mundo que amava seu irmão tão profundamente quanto ela . 

Enquanto inicialmente lidava com a perda de seu irmão por meio do álcool, drogas e um relacionamento sexual com seu chefe casado, quando Eden conhece Maya, ela finalmente consegue se relacionar com alguém sobre a tremenda perda que enfrentou. As duas garotas rapidamente se entrelaçam na vida uma da outra e embarcam em uma jornada para lidar juntas 


O enredo é enriquecido pela dinâmica entre as duas jovens que desenvolvem uma conexão profunda e complexa, marcada tanto por momentos de alegria quanto de dor. A direção de Nesher é notável por sua habilidade em capturar a essência da dor e da recuperação, misturando beleza com angústia. A fotografia de Shai Peled é vívida, capturando a atmosfera de Tel Aviv e as cenas de praia em Sinai, que simbolizam liberdade e perigo emocional.


"Come Closer" ilustra lindamente todos os estágios que vêm com o luto . Eden e Maya são completamente opostas uma da outra, mostrando os diferentes mundos em que Nati existia. Maya não tem a mínima noção do mundo em que Eden opera e, embora profundamente apaixonada por Nati, ela sempre se questionava se era interessante o suficiente para estar com alguém como ele.


"Come Closer" oferece uma visão única sobre a juventude israelense, abordando temas universais de luto, identidade e conexão humana, tudo isso com uma estética moderna que ressoa com uma audiência mais jovem. A atuação de Lia Elalouf como Eden é particularmente notada, trazendo autenticidade e profundidade ao papel.


A premissa de "Come Closer " é baseada em Nesher, cujo irmão faleceu há cinco anos e a quem o filme é dedicado. Essa informação só aumenta a tristeza que permeia o filme, mas não o restringe de forma alguma. Eden chega a um acordo com verdades que ela adiou enfrentar, exceto que a diretora consegue entregar um drama que entende a complexidade da vida, o que traz consigo um certo humor involuntário.