“Al Margen”, de Eduardo Casanova, é um documentário que explora a história de Moisés, um homem que botou fogo em si mesmo em Madrid, explorando as motivações por trás desse ato extremo. Filmado em segredo ao longo de cinco anos, o projeto reflete a ousadia de Casanova, um cineasta que já havia abordado a deformidade física em “Peles” (2017) e a complexidade das relações em “La Piedad" (2022). A figura de Moisés, inspirada parcialmente em um personagem secundário de “Peles”, torna-se o centro de uma narrativa que combina realidade crua com elementos oníricos, uma marca do estilo do diretor. Este trabalho, se diferencia pela abordagem documental, que evita julgamentos e prioriza a exposição de uma vida esquizofrênica à margem da sociedade.
O filme estrutura-se como um prisma, revelando camadas da existência de Moisés sem oferecer respostas fáceis. A narrativa explora temas como saúde mental, dependência química, violência e teorias conspiratórias, mantendo o foco na complexidade do protagonista sem transformá-lo em objeto ou espetáculo. Casanova, conhecido por sua habilidade em abordar o desconforto, consegue equilibrar a densidade emocional com uma estética que transita entre o realismo e o surrealismo.
A direção demonstra precisão ao construir uma trama que não se desvia de seu propósito, mesmo diante de um tema tão delicado e difícil. A escolha do formato documental permite ao cineasta refinar seu estilo, mantendo a essência de sua filmografia, que frequentemente desafia convenções. No entanto, a utilização recorrente da lente olho de peixe, embora inicialmente interessante por sua distorção visual, torna-se um recurso excessivo, mas não seria Casanova senão tivesse exageros!
O ritmo de “Al Margen" é contido, com uma duração que evita prolongamentos desnecessários. O filme mantém um equilíbrio delicado entre documentar a realidade e incorporar elementos estilizados, como coisas queimando, sem jamais ceder à tentação de explorar o sofrimento de Moisés de forma sensacionalista. Temas como sua esquizofrenia, ou o uso de cocaína desde os 12 anos, são abordados sem filtros.
A ausência de imagens explícitas, como uma fotografia do ato de Moisés, reforça a decisão do diretor de priorizar a dignidade do protagonista, e suas consequências. Essa escolha é coerente com a proposta de documentar sem julgar, deixando as cinzas do fogo falarem por si.
“Al Margen” é indigesto e difícil de assistir. Eduardo Casanova é um cineasta que vai além da direção, assumindo o papel de artista e observador da condição humana. O filme é um estudo sobre uma sociedade que marginaliza o diferente, utilizando Moisés como um espelho de suas contradições.
Nenhum comentário:
Postar um comentário