domingo, 27 de abril de 2025

On the Go (Espanha, 2023)

“On the Go”, de María Gisèle Royo e Julia de Castro, é um road movie que captura a essência de uma Andaluzia ensolarada, mas também o turbilhão emocional de seus protagonistas. Milagros (interpretada por Julia de Castro), uma DJ de 37 anos, está em um momento crítico: decidir se quer ser mãe, enquanto lida com as últimas chances de fertilidade. Ela foge de um compromisso de inseminação artificial e parte em um Chevrolet Corvair 67 rumo a Sevilha, acompanhada de Jonathan (Omar Ayuso), um jovem gay que busca no Grindr uma forma de lidar com questões de abandono. A jornada ganha um tom surreal com a entrada de La Reina de Triana (Chacha Huang), uma figura enigmática que diz ser uma sereia e redireciona o curso da viagem. Filmado em 16mm, o filme aposta em uma estética crua e tátil, com takes longos que capturam a vastidão das paisagens e a intimidade dos personagens.

Um dos aspectos mais marcantes de “On the Go” é sua exploração queer, que permeia tanto a narrativa quanto os personagens. Jonathan, vivido por um carismático Omar Ayuso, representa uma geração queer que busca conexão em aplicativos como o Grindr, mas também lida com traumas de abandono. Sua relação com Milagros é complexa: ela chega a usar a conta dele no app para encontrar um doador de esperma, levantando questões éticas sobre consentimento e amizade. O filme não julga seus personagens, mas os apresenta com uma honestidade crua, mostrando como a identidade queer de Jonathan e a busca de Milagros por autonomia desafiam normas heteronormativas. A presença de La Reina de Triana, uma figura que transcende categorias de gênero e nacionalidade, reforça a ideia de um mundo onde as regras tradicionais não se aplicam, celebrando a fluidez e a liberdade.

A trilha sonora, repleta de música e dança que evocam as tradições do flamenco andaluz, é outro ponto alto, funcionando como um fio condutor emocional. A escolha de ambientar o filme na Andaluzia, com suas paisagens que remetem a um faroeste moderno, adiciona uma camada de simbolismo: é um território de liberdade, mas também de confronto com o passado e o futuro. Milagros e Jonathan, em sua jornada, parecem estar fugindo tanto quanto buscando algo, e o filme captura essa dualidade com sensibilidade. A fotografia em 16mm, com seu grão característico, intensifica a sensação de nostalgia e urgência, como se os personagens estivessem vivendo um último suspiro de juventude.

“On the Go” se destaca como uma obra subversiva que dialoga com a tradição de filmes independentes e queer, como os primeiros trabalhos de Pedro Almodóvar, mas com uma perspectiva feminista e moderna. Ele venceu prêmios como o Panorama Spain no Festival Internacional de Cine de Las Palmas e recebeu menções especiais em Locarno e Valladolid, o que atesta seu impacto no circuito de festivais. Pode ser uma joia bruta: imperfeito, sim, mas pulsante com vida, emoção e uma visão única sobre amizade, desejo e autodescoberta. É um convite a abraçar a estrada, com todas as suas curvas e incertezas.


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