Almamula é um conto inabalável, pessoal e fantástico sobre amadurecer. O roteirista e diretor Juan Sebastian Torales faz da história de Nino(Nicolás Diaz), um conto íntimo e assustador sobre um adolescente que descobre que, se sua religião não puder abraçar sua sexualidade, ele encontrará uma criatura mítica que o fará.
Em seu antigo bairro, em Santiago del Estero, na Argentina, o jovem Nino é regularmente vítima de atos homofóbicos, até uma surra que quase o mata. Para evitar escândalos e estar mais perto do marido, sua mãe muito religiosa leva toda a família para o campo para as férias de verão. Diz-se que a floresta perto da casa é assombrada pela Almamula, uma criatura que se levanta contra qualquer um que tenha cometido um ato sexual impuro.
Este é o noroeste da Argentina, e em toda parte há tensão entre a civilização patriarcal, com suas restrições religiosas e impulsos urbanos e capitalistas, e a selvageria da floresta, onde a tradição é preservada por mulheres velhas, cujo espírito ameaçador assume forma feminina.
Há muitas versões da Almamula no folclore argentino. No cenário rural, a produção brinca habilmente com cenários do gênero terror. Os personagens juvenis que se tornam amigos da irmã correspondem ao grupo típico de um slasher adolescente. A floresta torna-se o local do suposto perigo, pois diz-se que uma criatura fantasmagórica reside nela. Isso, por sua vez, está associado à sexualidade "escandalosa".
Almamula vira as regras dramatúrgicas de cabeça para baixo de uma maneira fascinante: Nino tem que perceber que a verdadeira ameaça não é o "monstro" das trevas, mas sim a intolerância de pessoas que tentam justificar o medo e o ódio com sua crença em Deus.
As exceções são os homens que trabalham entre as árvores, muitos deles no emprego do pai de Nino. São homens assim que habitam suas fantasias eróticas em cenas que podem inspirar preocupação, porque ele ainda é uma criança. É um amadurecimento solitário, difícil e que aos poucos o leva a se identificar com a alteridade da floresta, um lugar que também está sob ameaça.
Um filme semiautobiográfico com um potente sentido de pertencimento, Almamula alterna entre realismo e fantasia. O cineasta escolheu sua própria terra natal, Santiago del Estero, como cenário. Sua história oscila entre o pesadelo e a realidade não menos assustadora.
O fato de que algo monstruoso é dado à sexualidade que deve ser evitado é revelado no filme de forma original como uma estratégia cínica. Como uma figura queer que é estigmatizada pelas pessoas ao seu redor, Nino logo não percebe mais o "monstro" à espreita nas sombras como um perigo. Se as pessoas iludidas aconselham a ficar longe de um lugar, esse lugar provavelmente não é o inferno que fantasiam, mas o único espaço seguro livre de dogmas e restrições de bullying.
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