O média-metragem Línguas Desatadas, é o tipo de recado urgente de uma sociedade negra e gay que vivia nos Estados Unidos sob as administrações Reagan e Bush; é um relatório das próprias margens, composto de alguma forma fora da linguagem habitual.
O diretor Marlon Riggs coloca à frente e no centro um núcleo de depoimentos - alguns falados, outros cantados, outros em rap- refletindo sobre o duplo preconceito enfrentado por homens negros e gays no epicentro da AIDS: atacados tanto por sua cor de pele quanto por preferências sexuais, de pregadores evangélicos e da cultura pop (Riggs cita a homofobia embutida no stand-up de Eddie Murphy e nos primeiros filmes de Spike Lee).
Pode parecer sombrio no papel, mas na tela se desdobra como um trabalho de surpreendente invenção formal: a trilha sonora aparece e faz piruetas entre poesia performática, rap e hard house, enquanto a edição é extremamente pontual.
O filme todo é acompanhado por um roteiro que encontra maneiras engraçadas e humanas de enquadrar seu dilema central: o diretor questiona aos seus entrevistados se eles se consideram primeiro como negros ou como gays.
Em vez de embarcar em alguma confusão acadêmica, Riggs pretende fazer uma celebração: Línguas Desatadas está orgulhoso por seu discernimento sobre vogue ou numa sequência ensinando os espectadores a arte de estalar os dedos.
Sim, as problemáticas são levantadas, mas aqui também está a grande diversão de ser negro e homossexual: é uma festa na qual vários assuntos são discutidos, mas onde o objetivo principal é fazer barulho e, assim, mais de três décadas depois, não importa que os parâmetros dessa discussão tenham mudado em graus variados, eles ainda ressoam.
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