Salão de Baile, de Juru e Vitã, oferece um olhar da favela para a cultura ballroom. Originária das comunidades periféricas de Nova York, essa manifestação artística ganhou o mundo, mas demorou para que tal visibilidade chegasse, mesmo com um hino POP que a exaltava.
Em 1990 Jennie Livingston, lançou Paris is Burning, filme que deu o pontapé inicial ao movimento new queer cinema, mas que permaneceu por muito tempo como um cult. Quando redescoberto, o ballroom e as casas de acolhimento ficaram em evidência, servindo de referência para DragRace, sendo lindamente ilustrado na série Pose, ou em realitys que colocavam a cultura em competição.
Os coletivos do movimento recebem principalmente pessoas trans e negras, jogadas às margens e nesse contexto, trazido para a realidade brasileira, sobretudo a carioca, é que Salão de Baile se desenrola, com muito close, quicação de bunda, bateção de cabelo e funk.
Mesmo que o filme exalte ícones da cultura ballroom, como Crystal LaBeija, uma figura fundamental para o movimento, imortalizada no documentário The Queen(1968), ele é sobre vivências locais, em um país transfóbico e que coage pessoas LGBTQIA+, especialmente em ambientes mais vulneráveis.
Sendo assim, Salão de Baile encontra conforto nas festas, onde as categorias, adaptadas para o cenário fluminense, como a Batekoo por exemplo, são maravilhosamente representadas. São nesses momentos, que a fotografia, de Suelen Menezes e Paula Monte, iluminam a cena e tornam os corpos do Salão de Baile cintilantes como devem ser.
A partir das experiências queer, dança, música e performance se transformam num mosaico de corpos em movimento, vozes sendo ouvidas e o pertencimento acontecendo. O Voguing, movimento da pista ballroom, e um dos principais passos, imortalizado na música de Madonna, é claro que ganha os holofotes, mas não sem dar uma cutucada pela apropriação feita pela Rainha do POP.
Tanto Juru como Vitã fazem parte do movimento ballroom do Rio de Janeiro, assim como a maioria da equipe do longa. “Mais do que um filme sobre a cena ballroom, nós fizemos um filme em conjunto com a comunidade ballroom. Queremos proporcionar ao espectador uma experiência de imersão no universo, com o nosso olhar ‘de dentro’”, explica Vitã.
As mães e as Houses cariocas ganham um novo espectro, uma nova identidade, novos horizontes e vocabulário, porém a essência permanece aquela do documentário realizado no final da década de 1980. A cena é retratada com o glamour decadente de um refúgio, para pessoas, que ainda hoje são marginalizadas, por questões sociais, por uma sociedade hipócrita que as oprime.
COLETIVOS QUE PARTICIPAM DO FILME
House of Alafia, House of Blyndex, House of Bushidö, House of Cabal, The Royal Pioneer Kiki House of Cazul, Casa de Cosmos, Casa de Dandara, Casa dy Fokatruá, House of Império, Casa de Laffond, House of Mamba Negra, House of Raabe, e 007 (são chamadas de 007 as pessoas que não fazem parte de nenhuma casa).