segunda-feira, 18 de agosto de 2025

Cama de Tatame (Brasil, 2025)

 

Com apenas nove minutos, "Cama de Tatame", de Otávio Oliveira, revela uma delicadeza rara ao filmar o cotidiano queer com sotaque cearense, filtrado por uma câmera que privilegia silêncios, gestos e pequenas cumplicidades. O protagonista, interpretado por Jefferson Vieira, encontra na amiga vivida por Jéssica Katiane um espaço de afeto que dispensa grandes diálogos: são olhares, presenças e uma rotina compartilhada que constroem a intimidade.

A estética, inicialmente casual, logo se mostra pensada com rigor. Planos que captam o ato de lavar louça ou uma faxina não são meros registros, mas ferramentas narrativas que traduzem sensações e vínculos. O mesmo vale para a sequência de videogame, que rompe a atmosfera mais contemplativa e injeta um frescor POP à narrativa, sem quebrar seu eixo emocional.

O filme também se abre a um registro mais sensual e reflexivo ao abordar o uso de aplicativos de pegação. Aqui, a montagem cria uma transição para um território quase onírico, onde o desejo é menos performado e mais imaginado, expandindo a dimensão subjetiva do personagem.

A direção de Otávio Oliveira se mostra hábil em todos os quadros. há cuidado, composição e proximidade, sem que nada soe artificial. A fotografia de Luiz Francisco, além de solar e intimista, oferece momentos oníricos, como na cena de sexo simbolizada por uma luta, revelando um diálogo entre o corpo, o desejo e a fantasia. A trilha sonora brinca com contrastes improváveis, misturando referências de Lucha Libre com Zé da Guerrilha.

Belamente fotografado, "Cama de Tatame" é mais do que um recorte de vidas, é um exercício de presença, que entende o cinema queer como um espaço onde a intimidade é política e o afeto, revolucionário. Ao transformar gestos banais em imagens carregadas de sentido, o curta encontra beleza naquilo que o mundo costuma não notar.

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