quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023

A Baleia(The Whale, EUA, 2022)

Darren Aronofsky apresenta em A Baleia, adaptação da peça homônima de Samuel D. Hunter, que também assina o roteiro, a vida de um obeso professor de literatura inglesa, Charlie (Brendan Fraser), agora incapaz de levantar e andar sem ajuda devido ao seu peso.

Charlie é apresentado quase imediatamente, em uma cena ultrajante que nos joga direto no fundo do poço: o herói se masturba em frente a um pornô gay e no final do processo tem um leve ataque cardíaco.


A figura do protagonista, em sua totalidade estética, é o tema central e, em parte metaforicamente, o título do filme. Após a morte de seu parceiro anos atrás, Charlie não parou de ganhar peso, punindo-se com seu luto e dor. A casa claustrofóbica é ao mesmo tempo uma alegoria de sua alma, que não conseguiu mais se libertar. Desde então trabalha sozinho, ministrando cursos online, nunca ligando a câmera.


No microcosmo representado pela casa de Charlie, dentro da qual ele agora luta até para se mover, Aronofsky apresenta uma após a outra uma série de figuras, a cuidadora Liz (Hong Chau), irmã de seu parceiro falecido, e o jovem missionário Thomas (Ty Simpkins) , que progressivamente vão se relacionando com o homem, entrando em contato direto com sua personalidade terna.


Brendan Fraser veste um imenso fat suit, um traje protético que transforma completamente o corpo de seu ator, mas esse detalhe nunca aparece como um limite e, ao contrário, parece estimular Fraser a dar o seu melhor, levando-o ao que de fato é a interpretação de sua carreira. 

Se há muito cuidado e empatia em explorar as razões por trás da obesidade de Charlie, principalmente em delinear o árduo processo de reencontro com a filha Ellie(Sadie Sink), o mesmo não se pode dizer do subtexto religioso. Temas como a percepção cristã da homossexualidade, a santificação do corpo e do espírito, as contradições das missões evangélicas são jogados em um grande caldeirão por Aronofsky.


Os principais pontos psicológicos do filme são os sentimentos que Charlie têm. Apesar dos esforços de sua amiga, Liz, ele recusa parcialmente a ajuda dela, e a ir para o hospital, pois acredita que não está mais salvo, psicológica e fisicamente, e que ninguém pode ajudá-lo, até que a filha Ellie(Sadie Sink), quem abandonou para viver seu romance homossexual, aparece.


A obra nos mostra em muitos lugares como a religião influenciou o parceiro de Charlie a cometer suicídio, mas também como levou o próprio Thomas a conclusões erradas, o que funciona como uma ferramenta para nos mostrar uma história de heresia e hipocrisia.


Aronofsky nos apresenta o problema do herói de forma contundente, tanto pelo roteiro quanto pela direção. O herói sabe onde está e o que está fazendo e vemos cenas em que ele come demais e come tudo o que encontra pela frente, apenas como uma ferramenta para cobrir seu vazio interior.


Referências repetidas à Bíblia e à Moby Dick garantem que o senso de alegoria permeie. Ambos são contos das tentativas de redenção da humanidade, o desejo avassalador de se livrar da carne ou livrar o mundo de um corpo que o assombra, trazendo camadas necessárias de complexidade para o filme.



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