A narrativa em primeira pessoa é o cerne de "Dreams", com Johanne guiando o público por meio de voice-overs que ecoam sua prosa confessional. Esse recurso, que poderia soar excessivo, é manejado com precisão por Haugerud, transformando os pensamentos da protagonista em uma janela para sua vulnerabilidade. Um coming-of age não convencional sobre a introspecção da adolescente, que oscila entre fascínio e dúvida e cria um clima melancólico que permeia o filme.
Os aspectos queer de "Dreams" são tratados com uma sutileza que evita rótulos, um dos grandes trunfos do filme. Johanne não se identifica explicitamente como queer, e Haugerud questiona a necessidade de categorizações ao mostrar sua resistência quando a mãe, Kristin (Ane Dahl Torp), tenta enquadrar sua experiência como um “despertar LGBTQIA+”. A atração por Johanna, uma figura boêmia e enigmática, é retratada com sensualidade contida.
Como encerramento da trilogia Sex, Dreams, Love, "Dreams" é o capítulo mais acessível emocionalmente, embora mantenha o estilo verborrágico e cerebral de Haugerud. Diferentemente de "Sex", que explora a fluidez sexual masculina, e "Love", focado em encontros casuais, "Dreams" volta ao primeiro amor, mas com uma perspectiva feminina e queer que dialoga com a Noruega contemporânea – um país igualitário, mas onde o desejo ainda enfrenta barreiras sutis.
"Dreams" não entrega respostas fáceis. Sua força está em abraçar a ambiguidade do desejo e da escrita como formas de autocompreensão. É uma obra que ressoa com a paixão por narrativas que desafiam normas com uma cadência escandinava contida e reflexiva. A vitória do Urso de Ouro não é apenas um reconhecimento da qualidade de "Dreams", mas um convite para revisitar a trilogia inteira, que, com suas conversas francas sobre sexo, amor e sonhos, oferece um espelho para as angústias e liberdades do nosso tempo.
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