segunda-feira, 13 de outubro de 2025

Lurker (EUA/Itália, 2025)

“Lurker” estreia Alex Russell na direção com uma tensão quieta que cresce no desconforto. Matthew (Théodore Pellerin), empregado de loja em Los Angeles, vive uma existência apagada, marcada pelo isolamento com sua avó e pela admiração distante por Oliver (Archie Madekwe), músico em ascensão. O que começa como admiração cotidiana transforma-se numa obsessão sutil, na infiltração calculada numa intimidade alheia. Russell vira esse espectador interno em protagonista, filmando a espiral de poder, fama e identidade.

Há um subtexto queer potente em “Lurker", embora jamais totalmente declarado. A relação de Matthew com Oliver navega entre fascínio, desejo e dependência. Não é uma paixão escancarada, mas o ciúme, o olhar demorado, as tensões do corpo disputando atenção, tornam realidade essa ambiguidade que muitas narrativas queer tratam como latente.

A estética do filme sustenta essa obsessão. A fotografia de Pat Scola constrói espaços claustrofóbicos mesmo em paisagens abertas, luzes de palco que brilham mas também ofuscam, reflexos de câmera que miram tanto o artista quanto o admirador. Momentos com vídeo caseiro e filmagens documentais se entrelaçam com cenas de show, bastidores, divulgação,  a mídia é parte do corpo narrativo do filme. É nessa costura que o voyeurismo vira espelho.


O filme evita cair em moralismos simples. Matthew não é simplesmente vítima ou monstro; ele é ambos e nenhum totalmente. Há empatia no modo como Russell filma sua solidão, seu jogo de impostura, seu mal-estar com os próprios desejos. Ele busca visibilidade como quem respira, com urgência. A obliteração do anonimato vira ato erosivo de identidade, algo tipicamente queer: a demanda por ser visto, por deixar de correr invisível.


Existe também uma crítica social que acompanha a obsessão: fama, cultura de celebridades, influência das redes e o desejo de relevância. “Lurker” mostra como proximidade com a celebridade pode se tornar forma de autoexploração. Matthew quer não só ser amigo de Oliver, mas ser parte de algo maior, elemento artístico, símbolo, “família escolhida”. Oliver, por sua vez, é protagonista de sua própria mitologia, alguém que escolhe quem pode entrar, quem permanece.


“Lurker” é uma obra inquieta que escava o desejo humano em tempos de imagem, celebração, e rejeição. Não apresenta o óbvio, mas oferece identificação: de quem já desejou algo proibido, quem já se sentiu outsider, quem já quis ser parte de alguma constelação de fama ou amor. É suspense psicológico, sim, mas também poema sobre identidade, visibilidade e o peso de querer pertencer.


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