segunda-feira, 9 de maio de 2022

O Fantasma(Portugal, 2000)


Durante vários meses, o cineasta João Pedro Rodrigues acompanhou os catadores de lixo de Lisboa, para que depois ele revelasse uma história sobre um deles que era inigualável em seu filme de estreia, O Fantasma.

O longa acompanha a odisseia noturna de um jovem lixeiro homossexual, suas imagens às vezes são cruas, mas são apenas a passagem necessária para chegar a outra dimensão, uma abstração que permeia a narrativa do longa.


Um dobermann está agitado em um corredor. Atrás da porta, dois homens fazem sexo, um deles com uma roupa preta de látex. Imagens misteriosas seguem a história quase linear de Sérgio(Ricardo Meneses), um jovem lixeiro, de 19 anos, que trabalha principalmente à noite e foi nascido em uma pensão pobre.

Sérgio rejeita as investidas de sua colega Fátima(Beatriz Torcato), parece se dar melhor com Lord, o cachorro do depósito, e se contenta com breves aventuras sexuais, e sempre fetichistas, com homens.

Um dia, enquanto limpava uma garagem, ele se depara com aquele que vai concentrar todas as suas fantasias: um jovem esportista com uma moto, que mora em uma vila com sua mãe e frequenta a piscina. A partir daí, Sergio rondará nas sombras, meio voyeur, meio predador, um fantasma da noite buscando aproximar-se do objeto de seus desejos.

No que O Fantasma poupa em palavras ele é rico em sequências estranhas, não exatamente oníricas, mas equilibradas sem aviso prévio, em virtude de uma lógica mais poética e explícita do que puramente narrativa.

O drama de Sergio é que a sexualidade parece ser seu único meio de comunicação, entregando-o a uma espécie de regressão animal, plenamente realizada nas imagens silenciosas. Na paisagem lunar do aterro, ele se verá reduzido às suas funções corporais mais básicas.

Rodrigues nos cativa com sua história ininterrupta de carga sexual. Sem diálogos perturbadores, sem subtramas. O Fantasma é uma fantasia, no caso de alguns desenvolvimentos de enredo, um delírio do protagonista.

O aspecto essencial, no entanto, é que se trata da transformação gradual do personagem em cachorro. Um fetiche claro, tanto quanto possível posto em prática, quando o pet play, há mais de 20 anos, do lançamento do filme, era algo ainda mais longe do comum.


Até Sérgio se dissolver completamente numa sinergia de cão, fantasma e pós-apocalipse, longe da humanidade em todos os sentidos imagináveis à sua infatigável ânsia de sexo, aos seus constantes atos de substituição, à sua obsessão por João(André Barbosa), ao seu fetiche, tudo se fundirá em uma existência onipresente de um mundo caótico. Mesmo que seja, possivelmente, apenas na imaginação do fantasma.



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