Em “Scarlet Blue", Aurélia Mengin entrega uma experiência cinematográfica hipnótica e visceral, lançando mão de um surrealismo psicodélico para retratar a turbulência mental de Alter (Anne-Sophie Charron), uma mulher marcada por depressão e esquizofrenia. A narrativa se movimenta como um sonho, imagens saturadas, cores neon intensas e enquadramentos oblíquos evocam um universo à la David Lynch e Bertrand Mandico, enquanto Mengin explora a psique de sua protagonista por meio de sessões de hipnose mística conduzidas por um curandeiro sexy (Léandro Lecreulx).
A estética do filme é sedutora e ousada, imprimindo ao mesmo tempo uma sensação de afeto e estranhamento. A cena em que Alter encontra Chris (interpretada pela própria Mengin) num posto de gasolina, em meio a sua crise, tem um tom de encontro místico e romântico, reforçado por uma trilha sonora que sussurra e vibra, refletindo a instabilidade emocional de Alter.
Mais do que um retrato de doença mental, “Scarlet Blue” carrega uma sensibilidade queer muito clara. A relação entre Alter e Chris não funciona apenas como romance convencional, mas como um gesto de afirmação identitária: o encontro entre essas duas mulheres, em meio às angústias de Alter, sugere que sua identidade queer está profundamente entrelaçada com sua dor e sua resistência.
Mengin constrói sua protagonista com nuances delicadas. Alter é uma mulher que vive assombrada: por uma mãe (Rosy) distante, por impulsos carnais que surgem em seus episódios psicóticos, e pelo vazio de lembrar de si mesma. A hipnose, nesse sentido, torna-se uma ferramenta narrativa poderosa para desvelar memórias reprimidas e traumas profundos, dando ao filme uma dimensão de mistério e revelação. É como se cada sessão fosse uma porta para labirintos psíquicos, onde o público testemunha vislumbres da verdade escondida.
Aurélia Mengin foi premiada como “Melhor Diretora” no FOGFEST, no Canadá, o que reforça a força autoral da obra. “Scarlet Blue” é um drama visualmente arrebatador que mistura terror, romance e introspecção para dar voz a uma personagem cuja saúde mental e identidade queer são centrais para sua narrativa.
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