Reinventando o clássico, Sonata de Outono(1978), de Ingmar Bergman, Pedro Almodóvar entrega em De Salto Alto um drama feminino sobre uma relação conturbada entre mãe e filha. Quando criança, Rebeca(Rocío Muñoz-Cobo) só queria a atenção da mãe, a popstar Becky del Páramo(Marisa Paredes), tanto que provocou a morte do próprio padrasto. No entanto, a artista viaja para trabalhar no México e deixa a pequena Rebeca aos cuidados do pai, em Madri.
Muitos anos se passam e Rebeca(Victoria Abril) vai até o aeroporto receber Becky. De volta à capital espanhola, mãe e filha têm um reencontro emocionado e muitos assuntos pendentes na mala. Para agravar a situação, Becky retoma um antigo caso com Manuel(Feódor Atkine), que agora é marido de sua filha.
Becky se surpreende ao ver um cartaz de um show com uma versão sua mais jovem. Se trata da transformista Letal(Miguel Bosé), que a imita na noite madrilenha. Quando a drag queen entra em cena dublando Un Año de Amor, Almodóvar nos oferece um momento mágico com várias drags e trans, numa celebração à diversidade. O encontro entre todos os protagonistas serve para reforçar o lado intolerante de Manuel.
Nos bastidores, porém, é que Becky e Letal protagonizam uma inusitada e incandescente cena de sexo, entre perucas, plumas e língua. Um mês se passa e vemos Eduardo, que seria a Letal desmontada, conversando algum absurdo com sua mãe hipocondríaca, reforçando mais uma vez as relações maternas, sempre presentes, no cinema do diretor.
Rebeca é apresentadora do telejornal local, e junto dela há a tradutora de libras, Isabel(Miriam Diaz Aroca), que traz uma dose de humor, aos momentos mais intensos, como quando a personagem anuncia em rede nacional que matou o marido em um crime passional. Javier Bardem aparece na cena como um assistente de produção. Anos mais tarde ele trabalharia com o cineasta em Carne Trêmula(1997).
Há um embate entre mãe e filha na prisão onde Pedro Almodóvar praticamente recriou diálogos de Sonata de Outono. A intensidade das atuações de Victoria Abril e Marisa Paredes é magnética. ‘Passei a vida te imitando e nunca tive sucesso’ desabafa a filha.
De Salto Alto é um filme vermelho. A cor mais característica na obra do cineasta aparece com frequência nos cenários, nos chanels usados por Victoria Abril, e é lógico nos primorosos saltos altos. A estética, mais madura, assume um certo lirismo e enquadramentos desafiadores, sem deixar de lado o kitsch. As canções de Becky del Páramo foram gravadas por Luz Casal.
O ato final transborda toda essa linguagem almodovariana. No início dos anos 1990, o diretor já havia dirigido grandes obras, vinha de Áta-me(1990) com a mesmíssima Victoria Abril e do estrondoso sucesso internacional Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos(1989), mas por se tratar de uma releitura é que o filme inova na trajetória do cineasta.
De Salto Alto é uma obra sobre mulheres e sua delicada complexidade. Um longa cheio de paixão que exala a alma feminina com momentos memoráveis, atuações impecáveis, diálogos vigorosos, e uma sensibilidade para contar uma história que só Almodóvar tem.
Eu acho que é um dos melhores filmes dele, se nao o melhor... Muito boa a tua critica! Dame una Teta! Ahora tengo tres!
ResponderExcluirEsse filme comentado por v deixa ele ainda mais exuberante
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