Quando o longa, de Felipe Nepomuceno, abre com imagens da ditadura ao som de Ave Maria, na voz de Ney Matogrosso, vislumbramos que uma crítica social está por vir. A luz, porém, irradia quando a tela corta para os Secos e Molhados, e sua representação libertária de androginia.
Contemplativo, o filme é construído em cima de um rico e raro arquivo audiovisual, com imagens da trajetória de Ney. O cantor, que explodiu com os Secos e Molhados, alçou carreira solo e foi rebolar sozinho nos palcos, sempre acompanhado de maquiagem, performances poderosas e um certo enigma sobre sua personalidade.
Reportagens televisivas dos anos 1970 e 1980, falam sobre a relevância de suas letras e de questionar limites entre feminino e masculino. Participações de Cid Moreira, Ronnie Von e Leda Nagle, ainda que antigas, enriquecem o filme, que traz também imagens de Cazuza, Caetano, Chico Buarque, Ângela Maria e Milton Nascimento, acenando para contar uma fatia da história da cultura POP, no país.
A narrativa é conduzida, além do acervo de imagens, por músicas de Ney Matogrosso, como sequências ao som de Como 2 e 2, Sangue Latino, Rosa de Hiroshima, Tem gente com fome, O mundo é um moinho e até Imagine, em dueto com Simone. Não há depoimentos recentes, ou seja o documentário é um longo e primoroso trabalho de pesquisa.
O filme acredita no poder das imagens, como veículo perpétuo de registro histórico e de arte. Assim como Ney Matogrosso quebrou e segue quebrando paradigmas, Nepomuceno transmite em sua obra um frescor em forma de homenagem, ainda que não totalmente biográfica, sobre a evolução da obra do maior performer/artista/cantor brasileiro da atualidade.
Sem dissecar o ídolo, o documentário reúne imagens, entre 1973 e 2019, e destaca que Ney, sempre manteve uma forma pacífica de lutar contra toda a forma de opressão. Como o próprio mesmo diz, em uma das raras cenas em que o diretor lhe dá a fala: “A liberdade que eu prezo tanto para mim, eu ofereço para as pessoas”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário