quinta-feira, 18 de dezembro de 2025

10DANCE (Japão, 2025)

“10DANCE”, de Keishi Otomo, parte de um território aparentemente clássico, o drama esportivo centrado na superação, para alcançar um lugar mais delicado. Adaptando o mangá yaoi de Inouesatoh, o filme encontra na dança de salão competitiva um espaço privilegiado para investigar desejo, disciplina e orgulho masculino, sem recorrer a espetacularização da dor ou a conflitos excessivamente traumáticos. O resultado é uma narrativa que aposta na contenção, mas jamais na frieza.

A premissa é tão simples quanto elegante. Dois campeões com talentos opostos e o mesmo nome, Shinya Suzuki (Ryoma Takeuchi), rei da dança latina, e Shinya Sugiki (Keita Machida), mestre das danças standard, unem forças para competir na prova das “Dez Danças”. O embate inicial entre swagger e rigidez, impulso e controle, constrói uma tensão que se manifesta tanto no corpo quanto no olhar. A rivalidade não é apenas técnica, mas simbólica, colocando em choque modos distintos de existir dentro de um universo regido por regras rígidas de performance e excelência.

Otomo compreende que o verdadeiro conflito de “10DANCE” não está no campeonato em si, mas no processo de contaminação entre esses corpos. Ao trocar ensinamentos, os protagonistas também trocam gestos, posturas e, sobretudo, afetos. O filme observa com precisão como a proximidade exigida pelas danças latinas, marcadas pelo contato e pela sensualidade, desestabiliza a formalidade das danças standard, tradicionalmente associadas a uma masculinidade mais contida e normativa. Essa fricção se torna o motor dramático do romance.

A encenação das coreografias é um dos grandes trunfos do longa. Cada uma das dez danças, ChaChaCha, Samba, Paso Doble, Rumba, Jive, Valsa Lenta, Tango, Valsa Vienense, Slow Foxtrot e Quickstep, é filmada de modo a evidenciar não apenas a técnica, mas a transformação emocional dos personagens. A dança deixa de ser exibição para se tornar uma linguagem íntima, um espaço onde o desejo pode existir sem a necessidade de nomeação explícita.

A fotografia sofisticada reforça o caráter glamoroso e opulento das competições, mas evita o excesso ornamental. O brilho do salão convive com momentos de treino exaustivo, suor e frustração, criando um equilíbrio entre fantasia e rigor físico. Nesse sentido, “10DANCE” entende o esporte como um ritual de exposição, no qual o corpo é simultaneamente instrumento de trabalho e superfície de afeto. A dimensão queer do filme se constrói na química entre Takeuchi e Machida. Trata-se de um romance cauteloso, quase casto, que provoca paixão sem recorrer à exploração sensacionalista. Essa escolha narrativa pode soar contida para parte do público, mas revela coerência com a proposta do filme, que prefere a sugestão à afirmação explícita, o acúmulo de tensão ao alívio imediato.

“10DANCE” é como uma fábula sobre transformação, onde vencer a competição importa menos do que atravessar as próprias defesas emocionais. Ao colocar dois homens em rota de colisão afetiva, o filme encontra beleza na disciplina e liberdade na repetição exaustiva do gesto. Um romance que dança no limite entre controle e entrega, e que entende o desejo como movimento contínuo, jamais como ponto de chegada.

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