A adaptação de “The Strange Case of Dr. Jekyll & Mr. Hyde”, dirigida por Hope Dickson Leach, é uma reinvenção ambiciosa do clássico de Robert Louis Stevenson, combinando teatro ao vivo e cinema em um formato híbrido inovador. Filmada em preto e branco no histórico Leith Theatre, em Edimburgo, a produção, inicialmente apresentada como um evento ao vivo em 2022, transporta a história de Londres para a sombria capital escocesa, explorando temas de corrupção, classe social e masculinidade tóxica. Com uma estética noir e uma abordagem que enfatiza a perspectiva de Gabriel Utterson (Lorn Macdonald), o filme busca revitalizar a narrativa gótica com um comentário social contemporâneo.
Uma leitura queer do filme ganha destaque ao explicitar o subtexto presente no original. A adaptação de Leach, co-escrita com Vlad Butucea, torna evidente uma relação passada entre Utterson e Jekyll (Henry Pettigrew), sugerindo um romance frustrado que alimenta ciúmes e tensão com a chegada de Hyde. Essa dinâmica, com cenas carregadas de homoerotismo — como Jekyll ajoelhado aos pés de Utterson —, amplifica a ideia de repressão e desejo em uma sociedade vitoriana rígida, onde identidades queer eram forçadas à clandestinidade. É uma interpretação corajosa que conecta a obra a discussões modernas sobre identidade e repressão.
A força visual do filme é inegável. A cinematografia em preto e branco de David Liddell cria uma Edimburgo gótica, com vielas escuras e silhuetas que evocam o cinema noir clássico. A escolha de filmar no Leith Theatre, com sets que misturam teatro e cinema, confere uma atmosfera claustrofóbica que reflete a psique fragmentada dos personagens. A trilha sonora eletrônica de Hudson Mohawke adiciona um toque moderno, contrastando com o cenário vitoriano e intensificando a sensação de inquietude.
A narrativa, centrada em Utterson como um advogado seduzido pela elite corrupta de Edimburgo, introduz uma crítica ao capitalismo e à ganância que, embora relevante, nem sempre se integra bem à trama. A ênfase em temas como exploração dos trabalhadores das cervejarias e a vaidade da classe alta, simbolizada pelo Monumento Nacional, adiciona camadas, mas pode parecer expositiva, com diálogos que explicitam demais as intenções.
“The Strange Case of Dr. Jekyll & Mr. Hyde” de Hope Dickson Leach é uma experiência visualmente impressionante e conceitualmente ousada que ousa mas não atinge todo seu potencial. Sua inovação híbrida e a releitura queer são pontos altos, mas a narrativa inconsistente e as atuações exageradas impedem que se torne uma adaptação definitiva. Ainda assim destaca o talento de Leach em reimaginar clássicos com um olhar moderno.
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