sábado, 13 de setembro de 2025

Queen Tut (Canadá, 2023)

“Queen Tut”, de Reem Morsi, abraça o queer sem medo do choque de sair do armário como uma travessia emocional para Nabil (Ryan Ali), para sua relação com o pai Iskander (Dani Jazzar), e para o legado familiar da mãe que era costureira. Há beleza no sofrimento, no bordado de memórias, no pano que vira traje de drag.

Alexandra Billings como Malibu brilha: não apenas como a mãe de Nabil no mundo drag, mas como símbolo de resistência, escolhendo a família drag quando a “família de sangue” falha em entender. Sua química com Ryan Ali dá densidade emocional, o filme mostra que afeto queer pode ser arte, pode ser política, pode literalmente salvar espaços, como o bar drag ameaçado de demolição.

Malibu, ativista incansável, enfrenta a ameaça de ver Mandy,  espaço que já foi casa, refúgio, clube e marco da história LGBTQIA+,  ser transformado em condomínios. Ao lado de suas, ela transforma a resistência em espetáculo, mantendo viva a memória da matriarca Mandy, que partiu deixando a aura de glamour intacta. Mesmo sem acesso a empréstimos para salvar o prédio histórico, a família insiste em lutar, convertendo lembrança em ato de sobrevivência coletiva.

Temas de aceitação se entrelaçam à dor da perda, transformando o filme em algo maior que um simples coming-of-age. A comunidade surge como elo entre passado e presente, lembrando feridas ainda abertas,  violência, assassinatos, a crise da AIDS, enquanto a exuberância drag celebra a vida em cores vibrantes. Essa dualidade, de luto e festa, se contrapõe à hipocrisia das instituições religiosas, que pregam acolhimento ao mesmo tempo em que perpetuam exclusão, reforçando a força do coletivo como refúgio e resistência.

A estética do filme mistura elegância visual com texturas de intimidade, pano de fundo árabe e ornamentos de costura, luzes da noite gay de Toronto, cores dos vestidos inacabados, e o contraste entre o concreto da cidade e os tecidos que fluem. Há algo performativo, algo transformador em cada costura, como se a alma de sua mãe bordada ganhasse vida cada vez que ele veste algo que ela fez.

“Queen Tut” é sobre reconstrução após a perda, sobre identidade latente que vai se mostrando aos poucos. Desejo, pertencimento, luto, ambição, temas universais, mas vistos por uma lente queer que insiste em representar juventude gay árabe, amante de drag, visível.

Por fim, “Queen Tut” reafirma que ser queer é também afirmar legados, reinventar memórias, transformar dor em facho de luz, em pano de palco. É um filme que celebra a arte drag, a cena queer, a família escolhida e aquela coragem silenciosa de quem resolve ser visto.

Nenhum comentário:

Postar um comentário