sexta-feira, 5 de setembro de 2025

L'émission a déjà commencé (França, 2023)

No final de 2023, a France 2 concedeu carta branca a Bertrand Mandico para criar um programa absolutamente descontrolado dentro da janela “Histoires courtes”. O resultado, “L’émission a déjà commencé”, é uma explosão audiovisual que subverte os códigos da TV aberta e reimagina o formato como ritual surrealista distante de toda convenção.

O programa se apresenta como um falso bloco televisivo: Mandico faz uma breve aparição com cabeça de rato de pelúcia e depois retorna em forma de marionete etérea, perguntando com voz doce e elíptica: "Estão me dizendo que o programa já começou?"


Em seguida, somos arremessades diretamente para o “Ciclo dos Bárbaros”.  três peças que orbitam seu longa “Conann”: “Rainer, A Vicious Dog in Skull Valley”, “Nous les barbares” e “The Last Cartoon” Cada uma destas obras expande o universo bizarro de Mandico com sua assinatura inconfundível.


  • Rainer, A Vicious Dog in Skull Valley: numa encenação que mescla teatro e ritual, uma diretora faz pacto com um cão-demônio para montar uma versão feminina de Conan. O resultado é um duelo entre criação artística e corrupção estética, desempenho visceral que ecoa cenas antropofágicas de “Conann”,

  • Nous les barbares: quatro atrizes (ou versões delas) oferecem um tour pelos cenários infernais do universo “Conann”. Em quatro prodigiosos planos-sequência, meramente atravessar esses limbos já é um mergulho nas fissuras da ficção e do horror cotidiano.

  • The Last Cartoon: um ensaio de fim-de-século sobre o próprio cinema, dividido entre otimismo, pessimismo e nonsense,  que mistura imagens animadas e quadros vivos, praticamente um Apocalipse estético assumido.

Mandico, o mestre da distorção e excessos, junta tudo isso com sua magia de “efeitos especiais feitos na hora”, glitter, poças de sangue falso, um espelho da cultura televisiva corrompida, “tão grotesco e tão verdadeiro”.


Em “L’émission a déjà commencé", a televisão torna-se templo do bizarro, o intermediário entre a lógica narrativa e uma epifania incômoda. É audiovisual que se transforma em cinema-trava-língua, espetáculo que rejeita explicações. Aqui, o show não apenas começou, ele expurgou o real.

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