"We Three Queens", criada por Michael Young, segue três moradores improváveis de um apartamento em episódios breves de no máximo 12 minutos, um desenho íntimo e nervoso que ganhou duas temporadas. A série mistura comédia seca e melodrama contido para explorar a vida cotidiana de uma família escolhida que funciona por afinidade mais do que por sangue.
No centro de "We Three Queens" está o gesto político de representar uma família queer improvisada, onde cuidado, desejo e dependência material se entrelaçam, a série evita a espetacularização do sofrimento e prefere mostrar os gestos mínimos do cuidado diário.
Ian (Danya Chichagov) trabalha num grupo de recreação infantil, ele é ao mesmo tempo cuidador e alguém que precisa ser cuidado, cena após cena revela sua ternura e insegurança, inclusive quando sua intimidade com Lamar é exposta de forma embaraçosa, um episódio o confronta com pais do playgroup, e essas tensões traduzem bem o preço emocional de quem abraça afetos não convencionais.
Lamar (Bert Cardozo) é apresentado como alguém que sobrevive também do próprio corpo, suas interações com clientes, o jogo de papéis e até as cenas de roleplay cômico que saem do controle mostram como o trabalho sexual aparece na série sem moralismo, ele é hustler, parceiro e catalisador de conflitos, a ambiguidade moral e afetiva de Lamar enriquece o núcleo dramático e força questionamentos sobre intimidade e economia do cuidado.
Delores (Linda Goranson), viúva e mais velha, funciona como matriz afetiva e alívio cômico, sua presença dona de casa com hábitos verticais tanto ampara quanto atrapalha as rotinas dos dois jovens, e a série usa momentos aparentemente menores, uma queda, um trocado oferecido, para revelar memórias e normas sociais que atravessam gerações, fazendo dela o coração inesperado do lar.
As duas temporadas beneficiam-se da química entre Ian, Lamar e Delores, o formato curto permite cenas demoradas e íntimas, e embora por vezes faltem fôlego para arcos secundários, a série conquistou atenção em circuitos de mídia digital e indicativos de premiações, o que confirma que produções pequenas e afetivas como "We Three Queens" têm fôlego para redesenhar o que chamamos de família queer na ficção contemporânea.
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