Robertinho Chaves, um multiartista brasileiro queer, andrógino, negro e de Candomblé, há mais de três décadas encanta Paris com sua arte. Nascido em Santo Amaro da Purificação (BA), Roberto Chaves é o protagonista de “Madeleine à Paris”, filme de Liliane Mutti. É sob o olhar sensível da cineasta — que há seis anos acompanha seus passos — que o protagonista entra em cena para contar sua história de resistência.
“Madeleine à Paris” é um longa que mostra os desafios e conquistas de um imigrante latino na Europa, o sonho de um artista, os limites e as superações da vida. As raízes transculturais tecem a trama que conta a caminhada de Robertinho, entre luzes, plumas e paêtes. A história desse personagem da vida real é mais do que um show, é um ato de resistência.
“Ver minha própria vida nesse filme foi emocionante, uma redescoberta. Revivi momentos do passado que me trouxeram até aqui. É muito gratificante ver as dificuldades e prazeres de tudo que passei, uma experiência mágica poder contar isso em um filme. Quando me vejo ali, vejo o artista que manifesta as culturas afro-brasileiras nas ruas de uma Paris nem sempre tão acolhedora com quem é diferente”, destacou Robertinho.
O artista, que foi convidado para ir a Paris pela primeira vez quando ainda era office boy no gabinete do então vereador de Salvador, Gilberto Gil, é o idealizador da mais importante tradição afro-brasileira na Europa, a “Lavagem de Madeleine”. Há mais de duas décadas o cortejo é símbolo da cultura brasileira na Europa. O desfile da “Lavagem de Madeleine” acontece há 23 anos em Paris, inspirado na Lavagem do Senhor do Bonfim, de Salvador, e abre o calendário do verão europeu.
A festividade começa na Praça da República de Paris e vai até a Igreja da Madeleine, onde lavam-se as escadarias da igreja. A celebração reúne a cada ano cerca de 60 mil pessoas, seguindo o trio-elétrico puxado por Carlinhos Brown e Roberto Chaves. Franceses, brasileiras e brasileiros, pessoas de diferentes nacionalidades, misturam-se nas ruas da capital francesa, dançando ao ritmo dos atabaques e cantando músicas em Iorubá.
No longa, assistimos a Robertinho como um orixá do cortejo da Lavagem e, à noite, sua outra faceta, com sua fantasia, maquiagem e performance de arlequim, no Cabaré Paradis Latin, onde começou a trabalhar há 33 anos. Robertinho circula entre o tradicional catolicismo francês e sua origem de Axé, do recôncavo baiano, de quem cresceu sob a guarda e bênção de Dona Canô, mãe de Caetano Veloso e Maria Bethânia. Entre uma edição da Lavagem e outra, ele viaja ao Brasil em busca de suas raízes familiares e espirituais. Suas vivências entre os dois países, entre o masculino e o feminino, o sagrado e o profano, fazem do filme um profundo mergulho em busca de identidade.
Único filme baiano dirigido por uma mulher na 48ª Mostra SP, “Madeleine à Paris” é um road movie afro-queer entre Paris e Santo Amaro da Purificação, na Bahia, como define Liliane Mutti, que coloca as duas cidades em diálogo.
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