O grande trunfo de "O Melhor Amigo" está em suas cenas musicais, que não apenas pontuam a narrativa, mas se entrelaçam a ela como uma espécie de celebração espontânea da vida. São momentos que elevam o filme a um “musical tropical”, com um repertório que vai de Xuxa, passando por hits como “Escrito nas Estrelas”, “Geme Geme” e “Flashdance”, e um momento muito especial ao som de “Amante Profissional”. Allan revela o processo por trás disso: “As cenas viraram músicas inteiras e a gente viu: ‘Nossa, isso aqui é um musical e pode ser o nosso 'Mamma Mia!' do Nordeste.’ Allan encontrou nas músicas dos anos 80 e 90 um eco perfeito para as emoções da trama.
Vinícius Teixeira, que interpreta Lucas, falou sobre a preparação: “Passamos um mês em Fortaleza, num processo complexo, preparando cenas, músicas e coreografias para chegar nos corpos”. Cada escolha é um lacre, a música reflete com, nostalgia as emoções dos personagens e te leva ao passado. A trilha, aliada à coreografia despretensiosa, dá ao filme uma energia de férias que é impossível não sentir.
Outro destaque é a descentralização do eixo Rio-São Paulo, uma escolha que enriquece o cinema brasileiro ao colocar Canoa Quebrada como protagonista visual. Allan reforça essa intenção: “Para mim, nunca teve dúvidas de que 'O Melhor Amigo' seria na praia de Canoa Quebrada, porque Canoa foi desde muito tempo um paraíso". Ele ainda fala sobre o empoderamento regional: “É uma alegria filmar no Nordeste e contar histórias que são com personagens do Nordeste também, e com equipe do Nordeste, num lugar de empoderamento.”
As imagens de Canoa Quebrada gritam "Nordeste" e te puxam para o calor da região. Esse pano de fundo solar contrasta perfeitamente com os conflitos internos de Lucas, um arquiteto em crise com o namorado Martin (Léo Bahia). A participação de drags locais, como Deydianne Piaf (Dênis Lacerda) e Mulher Barbada (Rodrigo Ferrera), reforça essa autenticidade regional, trazendo a efervescência da cena queer de Fortaleza e arredores para as telas com um brilho genuíno. Allan comenta a escolha estética: “Uma vez que personagens trans e drags faziam parte da história, eu trouxe para essa energia estética do filme um lugar de divindade queer, de a gente ver que esses corpos performam no lugar celebrativo, no lugar expansivo, num lugar de exuberância, uma coisa meio Madonna, meio gigante.”
A fotografia de "O Melhor Amigo", assinada por Ivo Lopes Araújo, é um espetáculo à parte. A luz solar intensa e as cores vibrantes do Ceará são exploradas com sensibilidade, realçando a beleza natural de Canoa Quebrada. As dunas, falésias e o mar cristalino são filmados com planos abertos e composições que convidam o espectador a mergulhar na paisagem, criando uma atmosfera de paraíso tropical.
E, claro, há as presenças icônicas que enriquecem o tom brega-chique do longa. Gretchen, interpretando a si mesma, surge como a rainha do rebolado em uma boate, entoando “Melô do Piripipi” e “Conga Conga”. Allan detalha a escolha: “A Gretchen estava desde o começo dos desejos iniciais do roteiro. Quando ele foi se corporificando com essa estética, com essas músicas, aí teve que ter a Gretchen, ela tem que ser ela mesma”. Sua participação é mais que um cameo: é um selo de celebração pop que dialoga com a proposta do filme. Já Mateus Carrieri, galã que povoou o imaginário gay dos anos 90, reaparece no cinema como José, um hóspede que, ao lado do namorado argentino Juan (Diego Montez), procura marmita pro casal, em cenas que misturam humor safado e ternura.
"O Melhor Amigo" não reinventa o gênero musical nem o romance queer, mas também não pretende isso. Sua força está na simplicidade assumida: um filme que quer ser gostoso, colorido e verdadeiro, como um fim de semana na praia. Deberton parece interessado em entregar leveza e afeto. É uma carta de amor ao Ceará, à diversidade e à memória afetiva dos anos 80, embalada por um elenco carismático e uma trilha que fica na cabeça. Para quem busca ir ao cinema e sair com vontade de dançar. Um close cearense, que faz amar, cantar rir e vibrar!
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