sexta-feira, 31 de outubro de 2025

Bloody Axe Wound (EUA, 2024)


 “Bloody Axe Wound”, de Matthew John Lawrence, revisita o gênero slasher com um olhar queer e uma lâmina afiada. A protagonista Abbie Bladecut (Sari Arambulo) é apresentada como a primeira assassina feminina de uma linhagem marcada pela violência. Em vez de fugir do monstro, ela o encarna e é nesse gesto que o filme encontra sua força simbólica. A herança familiar da brutalidade se transforma em campo de disputa entre tradição e identidade, entre o sangue que corre nas veias e o desejo de pertencer a outro mundo.

A narrativa acompanha Abbie em conflito com o legado do pai, Roger Bladecut (Billy Burke), uma figura mítica da família e do crime. Ao ingressar em uma nova escola, ela se aproxima de Sam Crane (Molly Brown), uma jovem musicista que rompe as normas de comportamento e desperta nela sentimentos de descoberta e rebeldia. O vínculo entre as duas funciona como eixo emocional do filme, uma linha de fuga no meio da carnificina. É por meio desse afeto que a protagonista questiona o que significa ser mulher, queer e herdeira de uma tradição de violência.


A direção de Lawrence combina horror e humor ácido em doses generosas.  A violência é gráfica e exagerada, mas sempre tingida de ironia. Essa construção visual aproxima o longa do horror cult, com ecos de John Waters e de filmes B, sem perder a alma adolescente que remete aos anos 80. O resultado é um espetáculo grotesco e divertido, onde cada jato de sangue serve também como comentário social.


Entre os temas que atravessam “Bloody Axe Wound” estão o patriarcado, o legado familiar e o conflito de gênero. A tradição violenta dos Bladecut é apresentada como um ritual masculino que exclui, marginaliza e dita papéis. Quando Abbie reivindica seu lugar nesse sistema, o filme transforma o slasher em alegoria queer sobre o direito de existir,  mesmo dentro da monstruosidade. A metáfora é simples e eficaz: herdar o horror pode ser também reinventá-lo.


Ainda que nem todos os elementos encontrem equilíbrio, especialmente o desenvolvimento do romance entre Abbie e Sam, que poderia ganhar mais densidade, o filme acerta ao inserir a experiência queer sem didatismo. A representatividade está entranhada na própria estrutura da narrativa: uma jovem que luta para definir quem é, entre a herança e o desejo. Lawrence parece mais interessado em provocar do que em explicar, e isso dá à obra um tom de anarquia que combina com seu sangue artificial e suas risadas sinceras.


“Bloody Axe Wound” é uma carta de amor distorcida ao horror e à diferença. Sua protagonista encarna a desordem como libertação e faz da violência um espelho invertido da identidade queer. O filme entende que o gênero slasher sempre foi, em sua essência, sobre corpos desviantes, aqueles que ousam existir fora da norma.


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