domingo, 19 de outubro de 2025
Sorry, Baby (EUA/Espanha/França, 2023)
“Sorry, Baby” estreia como um drama com pitadas de humor conduzido por Eva Victor, que escreve, dirige e vive Agnes, jovem professora universitária lidando com os anos após um trauma sexual cometido por seu orientador, Preston (Louis Cancelmi). O filme não mostra explicitamente o ato de violência, ele se concentra no que sobra: o luto, os efeitos psicológicos, os anos de reconstruçãoO filme estrutura-se em capítulos não-lineares, atravessando diferentes fases da vida de Agnes: pós-graduação, ensino, amizade queer com Lydie (Naomi Ackie), encontros com Gavin (Lucas Hedges). Essa narrativa fragmentada reflete como o trauma distorce o tempo, mistura passado e presente, confunde memórias e sensações, deixando o espectador sentir o peso da espera por cura.
Há uma representatividade queer palpável em “Sorry, Baby” não apenas pela autora/protagonista se identificar como não-binária, mas também pela forma como a identidade de Agnes emerge através de gestos de rejeição à norma de gênero, pela euforia de gênero, pelo modo como ela se veste, se comporta, se coloca no mundo. Não é um filme sobre coming-out, mas sobre ser quem se é mesmo quando o mundo espera outra versão.
O humor é arma e escudo. “Sorry, Baby” equilibra momentos de leveza com cenas de grande tensão emocional: interações desconfortáveis com médicos ou departamentos universitários que tentam agir formalmente, mas falham em ouvir; situações comuns que, para Agnes, trazem ecos do que aconteceu. A risada surge como ferramenta de defesa.
Tecnicamente, o filme brilha em sua direção visual sensível: fotografia intimista de Mia Cioffi Henry, cenários domésticos que parecem cavernas de solidão, espaços muitas vezes estreitos, luz sutil, enquadramentos que capturam a dissociação, o desconforto. A montagem (não linear) ajuda a construir o ritmo de oscilação entre normalidade e invasão emocional, entre aquilo que é vivido e aquilo que permanece espectral.
“Sorry, Baby” não resolve tudo, e talvez nem queira. Ele deixa lacunas, não oferece justiça fácil, não pinta personagens como monstros ou vítimas definitivas, apenas como humanos frágeis tentando atravessar algo que mudou para sempre. O filme celebra a persistência, a amizade, as margens onde a identidade pode respirar. Agnes não se reduz ao trauma, e isso por si só já é uma forma de vitória.
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