“Satranic Panic” abre com o assassinato brutal de Max, irmão encontrado de Aria (Cassie Hamilton) e parceiro de Jay (Zarif). A partir daí, Aria e Jay embarcam numa road-movie demoníaca pela Austrália rural, munidos de facão enferrujado, gírias drag e poderes recém-despertos para caçar um culto sombrio. Mackay mistura o horror de culto com a vibração queer da família escolhida e do ritual de rejeição.
A estética do filme transborda cor, giallo e camp: luzes rosa-azuladas banham o elenco antes da matança, trajes de pele humana se desfazem em demônios sarnentos, e as mortes vêm com CGIs viscerais e estilizados. A apropriação do horror de baixo orçamento torna-se festa visual,  o caos serve de tecido para a identidade trans que transborda fora da norma.
Na trama, a figura de Aria como drag performer e Jay como parceiro artístico/de transição cria um duplo eixo de dor e aliança. O gênero deixa de ser apenas “o que você tem” e vira “o que você faz, o que você enfrenta”. Quando Aria, Jay e Max enfrentam o culto, o que está em jogo não é só a vingança,  é a afirmação de que corpos desviantes não sintam mais a necessidade de se esconder. 
O terror aqui brinca com a sátira do pânico satânico dos anos 80, mas adapta o pânico à realidade queer: o susto já vem de quem diz “isso é errado”, de quem recusa corpos que fogem. Mackay ri das teorias conspiratórias que caçam “demônios” onde existe apenas diferença, e transforma qualquer aprisionamento de identidade num demônio literal a ser destruído.
A trama é delirante, às vezes desconexa, mas sempre viva. Aria e Jay são heroínas improváveis de um mundo sem ordem moral, onde vingança e glamour se misturam em doses iguais. Há sátira, terror e musical, e, acima de tudo, há liberdade. MacKay não busca coerência narrativa, e sim intensidade emocional. Em sua câmera, gênero é sempre verbo, nunca substantivo.
Com apenas 20 anos, e vários longas no currículo ("T-Blocker", "So Vam", "Carnage for Christmas"), Alice Maio Mackay confirma-se como voz de um novo cinema queer e trans: anárquico, ruidoso e desobediente. “Satranic Panic” celebra o excesso como revolta e o riso como sobrevivência. É uma carta de amor aos monstros, aos corpos que sangram em technicolor, às drags que enfrentam o apocalipse com delineador intacto. A diretora entrega uma festa assassina e queer onde o ritual é redimir-se, e a estrada é a pista de dança onde a vingança encontra o orgulho.
 
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