"Homens de Bem" é um golpe na zona de conforto, um coming-of-age que se entrega sem medo à investigação da masculinidade tóxica, do privilégio e da homofobia. Alejandro Andrade constrói, em tom de tragédia social, a história de Alf (Andrés Revo), um adolescente de classe alta que volta à escola católica após um ano fora e se vê deslocado entre amigos atletas e a sedução inquietante de Oliver (Joaquín Emanuel), o novo colega.
A força do filme está na maneira como ele transforma pequenas humilhações em violência estrutural. O roteiro, assinado por Andrade e Armando López, costura episódios de chantagem, provas de masculinidade e a lógica de proteção do grupo como uma máquina social que pressiona o jovem a renegar qualquer traço de diferença. O que parece um drama escolar se revela um estudo cirúrgico sobre como o medo da “desvinculação” social leva à traição e ao crime, produzindo consequências que reverberam muito além do pátio.
No centro dessa engrenagem emocional está a performance de Andrés Revo como Alf, premiada em festivais, como o de Morelia. Revo constrói um personagem dividido, capaz de ternura e de gesto ruim, mostrando como a vergonha e o privilégio podem transformar um desejo por pertencimento em violência.
Esteticamente, "Homens de Bem" equilibra realismo e lirismo, com uma paleta e um enquadramento que sublinham horizontes de classe e os espaços íntimos de vergonha. A opulência fria do colégio e dos lares de elite não serve apenas como cenário, mas como um ambiente que torna a queda e a vergonha de Alf ainda mais brutais e públicas. A trilha sonora assinada por Christina Rosenvinge, acrescenta uma textura inesperada, quase litúrgica, que contrapõe momentos de festa à sensação de estranhamento do protagonista.
Analisada por uma lente queer, a obra é clara em seu diagnóstico: a homofobia que atravessa o grupo não é apenas ódio explícito, é também uma economia de reputação que exige silenciamento e castigo. A aproximação entre Alf e Oliver, que representava uma rara porta de reconhecimento e sensibilidade, é tragicamente desviada pelo pânico moral e pelo cálculo social, rumo a um crime que fratura qualquer possibilidade de reparação, transformando desejo em ruína."
Andrade insiste no incômodo, na ambivalência dos personagens, e no custo humano do silêncio, deixando o espectador refletir sobre culpa, reparação e responsabilidade social. É uma obra mexicana com espírito jovem e feroz que nos força a perguntar quem somos quando pertencemos a um grupo, e que consequências pagamos por escolher a aceitação ao invés da verdade.
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