A trama acompanha Marioneta Negocios, uma espanhola rica, excêntrica e orgulhosa, que se estabelece no Equador com a missão inusitada de mudar a forma como os cuyes são vistos: de comida tradicional a bichinhos de estimação. Ao redor dela orbitam Coqueta Buenasuerte, Espada Muleta e Doña Quispe, figuras femininas intensas, contraditórias e cheias de desejos. Mais do que caricaturas, são alegorias de feminilidades diversas, que se impõem pela voz, pela roupa, pela ambição e pelo escândalo.
Um dos grandes destaques está nos romances de Marioneta. Sua relação com Coqueta Buenasuerte e também com a toureira Espada Muleta traz ao centro do palco cenas de puro melodrama sáfico. São momentos em que a série mergulha no exagero romântico, fazendo do amor entre mulheres uma explosão de cores, lágrimas e desejos. Esses encontros, carregados de paixão e teatralidade, transformam o melodrama latino em gesto de afirmação queer.
O que torna “Mujeres con Hombreras” fascinante é a estética. O stop-motion aqui não é só técnica, é linguagem: a textura artesanal dos bonecos, o exagero dos cenários, os ombros pontiagudos que parecem carregar o peso de um melodrama inteiro. Há ecos de Almodóvar em cada cor saturada, em cada gesto dramático que transforma a telenovela e o cinema de autor em uma paródia apaixonada.
No plano narrativo, o humor absurdo se mistura à crítica social. A obsessão de Marioneta com os cuyes não é apenas uma excentricidade, mas metáfora da tensão entre tradição e modernidade, entre identidade local e consumo globalizado. Nesse choque cultural, surgem as contradições de classe, de gênero e de colonialidade, tratadas com humor corrosivo.
“Mujeres con Hombreras” é um gesto cultural. Ao apostar no espanhol, em personagens femininas intensas e em uma estética camp, a Adult Swim legitima novas vozes e mostra que o surreal latino tem lugar no mapa global da animação. É engraçada, escandalosa, um pouco desigual em ritmo, mas necessária.
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