Sob o selo de Andy Warhol, “Sangue para Drácula”, de Paul Morrissey, já começa anunciando sua excentricidade: vemos Drácula, um afetado Udo Kier, entregando-se a um ritual de skincare, maquiagem e tintura de cabelo. A cena inicial não apenas subverte a solenidade do vampiro clássico, mas o insere no território do camp e da Pop Art, deixando claro que este não é um Drácula convencional, mas uma criatura moldada pela ironia e pelo exagero.
Comparado a “Carne para Frankenstein", também dirigido por Morrissey, “Sangue para Drácula" apresenta cenários igualmente exagerados, mas mais contidos, menos artificiais no grotesco. Ainda assim, o filme preserva a estética de teatralidade barroca, em que a atmosfera gótica dialoga com o underground.
Morrissey reconfigura o mito do conde não pelo realismo, mas pelo excesso estilizado. Aqui, o gótico tradicional é filtrado pelas lentes do escândalo, resultando em um Drácula que não é ameaça de sombras, mas caricatura autoconsciente de sua própria fragilidade. Entre o riso e o desconforto, a obra equilibra o horror e o ridículo, projetando a decadência de um vampiro aristocrático que se sustenta mais em gestos afetados do que em força sobrenatural.
A nudez ocupa espaço central, tanto como provocação quanto como materialização da estética warholiana. Joe D’Alessandro, muso de Andy Warhol, surge como objeto de desejo e símbolo de vitalidade, seu corpo atlético contrastando com a decrepitude do conde. Sua presença injeta camadas explícitas de homoerotismo, já que o olhar do filme o fetichiza com naturalidade, transformando cada aparição em colírio. Em contraposição, Drácula de Kier é frágil, doente, dependente do sangue de virgens para sobreviver, deslocando a virilidade vampírica para o campo da paródia.
O elenco secundário amplifica a aura excêntrica da produção: figuras caricatas, interpretadas de forma exagerada, constroem um universo teatralizado, onde a lógica narrativa se curva à performance. Esse excesso aliado à crítica social escondida sob o absurdo, transforma “Sangue para Drácula” em um texto queer por excelência. A quebra da solenidade do mito vampírico, a erotização masculina e a ironia diante da moralidade sexual criam um espaço de subversão que aproxima o filme tanto das experimentações da Factory quanto de um manifesto implícito contra normas de gênero e desejo.
“Sangue para Drácula” não busca aterrorizar, mas provocar, rir e incomodar. Morrissey cria um espetáculo de excessos que mistura gótico e camp com desfaçatez. Udo Kier entrega uma das interpretações mais icônicas do vampiro, ao mesmo tempo frágil e histriônico, enquanto Joe D’Alessandro oferece ao público uma presença física que concentra todo o homoerotismo da produção. No cruzamento entre horror, paródia e arte pop, o conde se reinventa mais uma vez, provando que o vampiro nunca deixa de refletir os desejos e as ansiedades de sua época.
quinta-feira, 2 de outubro de 2025
Sangue para Drácula (Blood for Dracula, EUA, 1974)
Marcadores:
Andy Warhol,
anos 1970,
blood for dracula,
halloween,
joe dallesandro,
paul morrissey,
pop art,
subversivo,
tbt,
terror queer,
Udo Kier,
underground
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário