sábado, 18 de outubro de 2025

Dreamers (Reino Unido, 2025)

 
Dirigido e escrito por Joy Gharoro-Akpojotor, “Dreamers” marca a estreia em longas-metragens de uma das vozes mais promissoras do cinema queer britânico contemporâneo. A cineasta, conhecida por produzir obras ousadas e socialmente atentas, parte de uma experiência pessoal para construir um drama político e afetivo sobre migração, amor e sobrevivência. A protagonista Isio (Ronkẹ Adékoluẹjo), é uma mulher nigeriana vivendo irregularmente há dois anos no Reino Unido. Quando é detida e enviada a um centro de deportação, aguarda o veredicto de seu pedido de asilo, convicta de que seguir as regras do sistema é o único caminho para a liberdade.

O ponto de virada de “Dreamers” acontece quando Isio conhece Farah (Ann Akinjirin), sua colega de quarto, uma mulher carismática e descrente da obediência. A partir desse encontro, o filme se abre como um território de descoberta e desejo. A amizade entre as duas cresce dentro do confinamento, transformando-se em um romance que questiona não apenas o poder do sistema, mas também o próprio conceito de liberdade

A força de “Dreamers” está em seu olhar queer sobre a resistência. O filme transforma o afeto em desobediência.. As protagonistas compartilham gestos de cuidado e solidariedade que funcionam como pequenos atos de revolta contra a desumanização institucional. A diretora insere esse drama íntimo em uma crítica estrutural ao sistema de imigração britânico, evidenciando o modo como burocracia e racismo se combinam para esmagar sonhos e apagar identidades.


O longa é marcado por uma fotografia delicada e simbólica. Os ambientes frios e assépticos do centro de detenção contrastam com a luz suave e o calor dos momentos de intimidade entre Isio e Farah. Há uma cadência poética na forma como Joy Gharoro-Akpojotor filma o silêncio, cada olhar carrega a memória de uma vida interrompida, cada toque parece desafiar o tempo e a norma. 


As atuações são a grandeza do filme. Ronkẹ Adékoluẹjo constrói Isio com uma contenção dolorosa, equilibrando medo e esperança; Ann Akinjirin oferece a contrapartida perfeita, expressando em Farah uma rebeldia suave, quase contagiante. Juntas, as atrizes sustentam uma química emocional que transcende o romance e se transforma em manifesto.


Se por vezes “Dreamers” se aproxima demais do simbólico e deixa pontas narrativas pouco desenvolvidas, essa escolha estética parece coerente com o próprio tema: a fragmentação da experiência migrante, o tempo suspenso da espera, a sensação de viver entre fronteiras. Joy Gharoro-Akpojotor constrói uma narrativa de sobrevivência que recusa a passividade e reafirma o poder de sonhar mesmo sob o olhar do opressor. Entre grades, burocracias e ameaças, resta o gesto mais radical possível: amar.

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